Aluno 146
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Reitero a sensação de impossibilidade para elaborar um memorial verídico da minha trajetória no mundo da leitura e escrita (tal dificuldade creio ser de comum acordo a quem se dispõe a tentar), porém, há resquícios de imagens e interpretações próprias do meu ambiente infanto-juvenil que certamente formaram o cerne de minha atual aptidão em deleitar-me no mundo das letras. Concordando com Freire (1989, p. 9) "A leitura do mundo precede a leitura da palavra [...]", houve etapas em que tive antes do contato com as sílabas, palavras, livros, que me sujeitar a mero expectador do uso destas "ferramentas" previamente ditas.
Os momentos de observação e reflexão cognitiva, em relação as histórias - narrativas - utilizados pelos professores das séries iniciais de ensino impuseram-me um primeiro contato com a noção de texto/leitor, nisto inserida toda uma leva metodológica de ensino previamente determinada pelos educadores. Tal formação escolar que tive não abasteceu-me, ao meu ver, de uma "primeira impressão" considerável, que me fizesse sentir cativo pelos livros e suas histórias. Cresci nesta oscilação entre pegar um livro e largá-lo, nunca havendo (no montante de práticas disciplinares) uma frequente campanha professor-aluno que me motivasse a esta prática. Sobre esse aspecto explica Rottava (2000, p. 12 - 13):
[...] chamo a atenção para o fator limitante de não ser desenvolvida na escola a leitura, pois quando coloco que a escola alfabetiza acreditando estar expondo os alunos à prática da leitura, na verdade o que está fazendo é "treinando-os" a simplesmente decodificarem um material escrito.
Agora avançando até os meus 16 anos, já no ensino médio, vejo um contato maior que passei a ter com a leitura e escrita. Afora a carga mais quantitativa de textos dos anos finais do ensino fundamental, me formei neste sem ainda estar convicto das proporções possíveis da leitura e escrita em meu desenvolvimento pessoal e profissional. Com o advento de um estágio em uma das secretarias do município de Porto Alegre, passei a ser cobrado a elaborar textos e formulários. Eis a necessidade surgida de me atentar aos detalhes do que escrevia e lia. Arquitetando memorandos e organizando planilhas, tive noções da importância de uma boa gramática e do conhecimento vocabular. A relevância desta concepção de valor da leitura é definida assim por Rottava (2000, p. 13) "A leitura só é parte da construção do conhecimento como prática social que se insere nas práticas discursivas de que o leitor participa no cotidiano [...]".
Concernente ao prejuízo de uma má compreensão da leitura no ensino básico, posso afirmar que, infelizmente, ocasionou um tardio gosto pela escrita. Minha dedicação em consultar o dicionário e incrementar a cada dia mais palavras em meu discurso foi uma necessidade que tive para justamente poder permanecer num posto de trabalho; estendendo esse viço por conhecimento lexical ao meu meio pessoal, pareceu-me estar diante de um universo totalmente desconhecido - e animador. Felizmente, compreendi que a leitura não é um fim, e sim um meio pela qual passei a fazer uso na minha leitura de mundo. Reunindo este último conceito com o entendimento prévio que tive de leitura no ensino básico, percebi a falta de esclarecimento quanto a importância destes dois termos agindo em meu desenvolvimento. A pluralidade de acepção destas palavras é complexo, sendo inteligível, por exemplo, nas palavras de Britto (2012, p. 27):
No que tange à pedagogia da leitura, interessa especialmente observar que interpretar não é ler (ainda que faça parte da leitura), da mesma forma que uma leitura é diferente de uma escuta de falas do dia a dia. O teatro, a música, o cinema, a pintura, assim como a aula, não são leitura propriamente: supõem processos intelectuais diferentes, mesmo que muitas vezes tão complexos quanto e com muitas articulações com a leitura do texto. Não se diz isso desprezando tais atividades e objetos de cultura, mas exatamente para evitar um pernicioso e inútil pan-conceito de leitura. Se tudo for leitura, ler não será nada.
Em relação ao aspecto "aparentemente paradoxal" de Britto (2012, p. 28), "de que o destinatário da promoção da leitura é alguém que sabe ler e que, por razões várias não "lê", as variadas razões, no meu caso, foram certamente a infinidade de outras possibilidades de entretenimento, marcas do século XXI, compartilhados em todo o mundo via globalização: videogames, música, filmes; todos estes exemplos são filtros por onde passam a atenção de potenciais leitores que não conhecem (ou não puderam conhecer) as benesses da leitura. A partir do momento em que dividi meu tempo entre os entretenimentos digitais com os livros, mediante um discernimento da recompensa da leitura, eu já estava lendo por prazer. Favorecido pela biblioteca "em nuvem" que a internet dispõe, coleciono desde então mais livros do que sou capaz de ler ante as responsabilidades do dia a dia. Daí para a consequente vontade de emular um estimado escritor foi um passo. Escrever tornou-se indispensável para tamanha inspiração.
Não vejo impedimentos pra quem se dedica a ler e escrever. Assim como percebi (li) possibilidades de uma nova interpretação da sociedade (no todo), comparando cada leitura em sua temática específica, qualquer pessoa está apta a aprender e compartilhar deste conhecimento literário, linguístico, o que for, em prol da sustentabilidade grafa do meio social, cultural em que vive; por meio da leitura e escrita, alterei minha perspectiva do mundo. Nas palavras de Freire (1989, p. 13):
De alguma maneira, porém, podemos ir mais longe e dizer que a leitura da palavra não é apenas precedida pela leitura do mundo mas por uma certa forma de "escrevê-lo" ou de "reescrevê-lo", quer dizer, de transformá-lo através de nossa prática consciente.
Referências
Freire, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam / Paulo Freire. - São Paulo: Autores Associados: Cortez, 1989. p. 9
Rottava, Lucia. A Importância da Leitura na Construção do Conhecimento. In: Espaços da Escola, Ijuí, Editora UNIJUÍ, nº 35, jan/mar. 2000, p. 12 - 13.
Britto, L. P. L. LEITURA: ACEPÇÕES, SENTIDOS E VALOR. estudos sobre Educação. Ano XVIII, v. 21, n. 22, p. 18-32, jan./abr. 2012, p 27, 28.
12/07/2017
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