quarta-feira, 26 de julho de 2017

Leitura: uma evolução na construção de sentidos

Aluno 141
Reescrita


A leitura é um processo de atribuição de sentidos que vai além da simples decodificação de símbolos. Por esse motivo, saber unir letras não garante que o leitor terá facilidade em suas leituras. O ato de ler constitui uma relevante ferramenta para a formação do "conhecimento de maneira geral, contribuindo para a construção do conhecimento de várias áreas, tais como a matemática, a história e as ciências" (ROTTAVA, 2000, p. 12). Dessa forma, relembrar trajetórias de leitura é uma importante ferramenta para a compreensão do papel do conhecimento prévio neste processo. Duas das minhas dificuldades durante a infância, particularmente, servem para ilustrá-lo.
Ainda durante a alfabetização, resolvi me empenhar na minha primeira experiência literária com o livro "Harry Potter e a Pedra Filosofal", de J.K. Rowling. Segundo Kleiman (1995), para atingir a compreensão de um texto, o leitor necessita ativar uma série de conhecimentos linguísticos, textuais e enciclopédicos que o auxiliarão na significação do escrito. O livro, voltado para um público infanto-juvenil, não exigia conhecimentos de mundo que não faziam parte do meu conhecimento prévio. Além disso, diante do caráter fantástico do seu conteúdo, muitas das informações necessárias eram trazidas pela própria obra, objetivando criar seu universo particular. Mesmo assim, demorei cerca de um mês para ler o livro de pouco mais de duzentas páginas. Por mais que eu tivesse, como leitora, engajado meu conhecimento de mundo para realizar a leitura, faltou conhecimentos linguísticos e textuais para estruturar a formação de significação, o que demonstra a necessidade da utilização de diferentes saberes no ator de ler.
A próxima dificuldade na leitura de um livro ocorreu nos meus doze anos, momento em que precisei elaborar um roteiro para um curta metragem baseado na peça Romeu e Julieta, de Shakespeare. Na primeira leitura, não consegui me apropriar do texto suficientemente para usá-lo de base para elaborar o meu próprio roteiro. Dessa vez, eu tinha os conhecimentos linguísticos e textuais para compreender o texto, porém faltava conhecimento de mundo no meu eu ainda criança para compreender as intrincadas relações de amor e ódio desenvolvidas no drama.
Foram duas as estratégias utilizadas por mim na época: a primeira foi dar mais de uma chance para o livro, apreendendo melhor seu conteúdo por meio da releitura; a segunda foi procurar algum objeto de comparação para  expandir meu conhecimento sobre o assunto. Conforme Rottava (2012), dificuldades na leitura podem ser contornadas por estratégias diversificadas, entre elas a releitura e a comparação. Em uma primeira leitura do livro, não consegui atingir sua completa significação. Depois de comparar sua história com uma adaptação cinematográfica, perceber diferências e semelhanças, e permitir uma revisitação ao texto, consegui construir um sentido e apropriar-me do conteúdo para poder modificá-lo.     
Essas investidas literárias dificultosas me ensinaram mais sobre a minha habilidade leitora do que muitos livros que lia facilmente. Se a leitura é um "ato social entre dois sujeitos – leitor e autor – que interagem entre si, obedecendo a objetivos e necessidades socialmente determinados" (KLEIMAN, 1995, p. 10), então eu não conseguia, aos doze anos, dialogar com Shakespeare por meio das páginas de sua peça. Esse é um fato, contudo, que parece bastante natural, tendo em vista que leitura é um processo interativo que exige o uso ativo de diferentes conhecimentos, alguns que ainda nos faltam durante a infância. Como ressalva, eu poderia levantar a importância da escola solicitar a leitura de livros condizentes com o conhecimento prévio do aluno. Entretanto, hoje, ao revisitar as páginas do mesmo livro cuja leitura foi exigida pela minha professora, a história ainda me parece familiar e a escrita antes pouco amigável se tornou muito convidativa. Mesmo com as dificuldades para construir os sentidos do texto, aquele livro e estilo de escrita passaram a fazer parte do meu conhecimento prévio, sendo natural que hoje não enfrente dificuldades parecidas nas minhas novas leituras.
     
Referências
KLEIMAN, Angela. Texto e Leitor: Aspectos Cognitivos da Leitura. 4ª ed. Campinas, SP: Pontes, 1995. p. 01-27.
ROTTAVA, Lucia. A importância da Leitura na Construção do Conhecimento. Espaços da Escola, jan-mar, nº35. Editora Unijuí, 2000.
ROTTAVA, Lucia. A Leitura em Contexto Acadêmico: O processo de construção de sentidos de alunos do primeiro semestre do curso de letras. Santa Cruz do Sul, v. 37 n.63, p. 160-179, jul.-dez., 2012.
BRITTO, Luiz P. L. Leitura: Acepções, sentidos e valor. Nuances: estudos sobre Educação. Ano XVIII, v. 21, n. 22, p. 18-32, jan./abril. 2012.
        

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