segunda-feira, 10 de julho de 2017

Aluno 114
Reescrita


São poucas as artes que possuem uma capacidade tão imersiva quanto a sétima. A partir dela, podemos conhecer e visualizar mundos e histórias que nunca foram nem mesmo sonhados por nós. Entretanto, a experiência de admiração do cinema pode ser atrapalhada por fatores do mundo real que quebram a ilusão de estarmos inseridos em uma nova realidade.
Uma vez que nos encontremos em meio a uma sala de cinema, espaço reconhecidamente coletivo, temos consciência de que estamos suscetíveis a perturbações por parte de nossos parceiros de filme. Nossos sentidos, incapazes de se mostrarem seletivos quanto àquilo que queremos observar e ouvir, por exemplo, são constantemente atiçados por esses indivíduos que não parecem
Em função de normalmente nos encontrarmos numa sala escura, que não apresenta muito mais do que filas e filas de poltronas encostadas umas nas outras e que vão se dispondo em planos cada vez mais altos à medida que se distanciam da tela, retângulo grande e de cor clara exposto na parede para qual todas as poltronas estão viradas (e que também servirá de superfície em que o filme será projetado), são poucas as intromissões que atrapalham a nossa visão. Esse sentido por sua vez, é um dos mais importantes quando tratamos de filmes, uma vez que é essencial para que possamos efetivar o processo de imersão. Não há como se pensar dentro de um filme sem que se possa observá-lo.
Aliás, é justamente pelo fato de as imagens na tela chamarem tanto a nossa atenção que investimos muito pouco do tempo que dispomos em um cinema olhando para qualquer coisa que não elas. A audição, por outro lado, ainda que também seja de suma importância para que aproveitemos propriamente a nossa experiência, se mostra muito mais responsável por nos dispersarmos daquilo que assistimos.
Afinal, para visualizar algo qualquer que não o filme, temos que nos movimentar, temos que tornar o nosso olhar para tal elemento. Já para escutar algo que não queremos, não é necessário executar esforço algum. Os ruídos surgem e nós os compreendemos, ou pelo menos os apreendemos, e assim de súbito, já não mais nos encontramos dentro de um novo universo, apenas dentro daquele no qual existimos em todos os outros momentos de nossa vida.
São muitas as possibilidades de distrações que podem surgir, desde uma conversa alheia até o toque de um celular. Porém nenhuma é tão frequente nesse ambiente quanto o som de pipoca sendo mastigada.
É de se impressionar que algo tão pequeno como um grão de milho explodido possa fazer tanto barulho. Sua textura levemente áspera, sua cor opaca, seu cheiro de manteiga e gosto, por vezes, tão salgado quanto água do mar. Ora, é compreensível que tanta gente o eleja como seu lanche preferido para desfrutar durante um filme. Mas são poucas as coisas mais irritantes do que estar concentrado em uma história e de repente creck!
Para não ser, então, uma dessas pessoas que não apenas incomodam, como também são cegas ou insensíveis ao incômodo que causam evite colocar uma quantidade excessiva delas na boca ao mesmo tempo. Cerca de três ou quatro pipocas por vez já devem ser mais do que o suficiente. Você pode mastigá-las lenta, delicada e cuidadosamente para emitir o mínimo de ruído possível. Afinal, todos nós já estivemos na posição de ouvinte irritado com a mastigação alheia. Pense, portanto, nesse exercício não como uma forma de praticar a eficácia do seu silêncio, mas sim a sua capacidade de empatia.



Nenhum comentário:

Postar um comentário