quinta-feira, 20 de julho de 2017

PEQUENAS ALEGRIAS

Aluno 152
1 Versão


Existem pessoas no mundo que nós amamos ao ponto de nos dispomos a tudo para fazê-las felizes; mas às vezes, o que recebemos de volta é um: “Aii! Sai de cima de mim Ju, tu é muito pesada.”. Pelo menos foi assim comigo naquela manhã de quinta-feira, um desses dias nos quais os acontecimentos parecem conspirar para dar errado. Como já era usual, subi na cama de Aline para despertá-la; minha intenção foi apenas de fazer seu dia iniciar com mais carinho, mas fui expulsa de lá aos gritos. Tudo bem, pensei comigo, ninguém tem bom humor logo de manhã cedo, não é mesmo?
Contudo, esse não era um dia qualquer. Eu sabia que chegara o dia de seu aniversário, afinal, ela falou disso a semana inteira; me contou dos presentes que queria ganhar; dos doces que faria para os amigos; até mesmo da cor do vestido escolhido para a data tão especial dos seus 21 anos. Entretanto, não só parecia que isso havia evaporado de sua memória, após o susto causado por mim ao acordá-la, como também, aparentemente o ocorrido deixou-a irritadiça.
Assim, a fim de tentar reparar a situação e poder ver ela abrir aquele contagiante sorriso, fui ao jardim colher uma flor para dar de presente a ela. Mas ao retornar à casa com aquele belo exemplar botânico, mais uma vez recebi apenas represálias: “Eu não acredito que tu mexeu na grama de novo! E ainda por cima espalhou terra pelo tapete todo! Quantas vezes eu já te disse para não fazer isso?”. Mesmo morando com Aline a anos, eu nunca aprendi a lidar com o medo que aquela voz quando braba me causa; por isso, optei por ficar escondida em um pequeno canto, pelo menos até passar a raiva encadeada pelos meus atos.
Após alguns minutos, a limpeza dos rastros que eu havia deixado estava concluída e ela pode tomar banho para ir trabalhar. O resto do tempo dela em casa, passei somente observando de longe; eu estava magoada pelas duras atitudes, mas ao mesmo tempo, esperançosa de, em algum momento, finalmente ganhar sua atenção e amor. Entretanto tudo o que recebi, durante a saída dela em direção a porta, foi: “Vê se não faz mais bagunça, hein, Juju”.
Enquanto Aline estava fora, o tempo pareceu arrastar-se da forma mais lenta possível. Eu me sentia como um dos relógios no famoso quadro de Dali, interminavelmente escorrendo, na pintura daquela estranha arte que ela tanto gosta. Com o propósito de passar algumas horas, resolvi dormir um pouco; deitei no quarto, na cozinha e até no sofá, o qual ela nunca me deixa subir se está em casa. O movimento de ir e vir até a janela voltada para a rua, tornava minha espera angustiante, contudo, o sentimento de saudade era ainda mais forte e não permitia dominar meu ímpeto. Em meio a essas andanças pelo nosso lar, percebi que a noite se aproximava e, com ela, uma forte chuva; dessas torrenciais, com direito a raios, trovões e até ruas alagadas.
Logo, foi com esse clima que minha tão esperada companhia chegou em casa. Ao ouvir o som das chaves na porta, fui imediatamente esperá-la no corredor principal; todavia, mesmo em meu inebriante estado de alegria, pensava comigo:“Não posso demonstrar minha felicidade! Preciso me conter, se não ela ficará com raiva mais uma vez.”. Contudo, falhei nesse objetivo no momento em que a vi. Era impossível controlar a vontade de correr em direção a ela e lamber aquele rosto tão amado.
E assim o fiz. Corri saltitante para abraçá-la, mesmo conhecendo o risco de mais uma vez ouvir que eu era pesada ou que minhas patas sujavam sua roupa. Mas no instante em que cheguei ao seu encontro, tive uma infeliz surpresa: aquela voz, sempre tão alegre ao me saudar, hoje estava carregada com uma pequena dose de pesar; seus brilhantes olhos também não escapavam disso e se encontravam cheios de lágrimas. Vi Aline sentar-se no chão e me abraçar fortemente, enquanto contava sobre os telefonemas que recebeu durante o dia, dos amigos que cancelaram a presença em sua festa por causa da inesperada chuva.
Eu não sabia o que fazer, afinal, pela manhã eu já havia tentado de diversas formas fazê-la sorrir e não consegui. “Se nem flores a ajudaram, o que poderia animá-la?”, pensava eu. Até que então, de súbito tive uma genial ideia. Saí de seus braços, fui em direção à minha casinha e voltei rapidamente, trazendo em minha boca o que, depois de Aline, era a coisa que mais me fazia feliz: a minha bolinha vermelha, o primeiro presente que ganhei ao ser adotada.
No momento em que larguei em seu colo aquele velho objeto todo babado, minha doce amiga se desatou a rir incontrolavelmente. Enquanto abraçava a mim e a bola, ela dizia “Aii, Juju! Só tu mesmo pra me fazer rir em um momento assim. Tu não é um cachorro, tu é gente! Parece até que entende as coisas que falo.”. Aline nem imaginava o fato que eu realmente entendia, apenas não sabia me comunicar na mesma forma das pessoas. O que, no fim das contas, não faz falta, uma vez que basta a linguagem do amor e da compreensão para mudar o dia de alguém e conseguir fazer a adorada pessoa rir tão feliz.

Nenhum comentário:

Postar um comentário