Aluno 49
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Eu chorei mais alto do que qualquer bebê da ala da maternidade. Ninguém conseguiu me convencer de que eu estava segura fora do ventre materno. Até mesmo a minha mãe perguntou ao médico se não havia alguma maneira de me reaconchegar no útero temporariamente. Continuei gritando por dois dias seguidos, fazendo com que as pessoas que estavam no hospital tivessem a impressão de que seus tímpanos estavam esfarelando subitamente, como uma bolada repentina na arquibancada de um jogo de futebol.
Demorei meus dois primeiros anos de vida para aceitar o acontecimento que me foi imposto goela abaixo: não decidi nascer, decidiram que eu nasceria. Inclusive porque, se coubesse a mim tal incumbência, provavelmente ainda estaria no abdômen de minha mãe fazendo uma lista de prós e contras, sem conseguir alcançar um consenso comigo mesma. Talvez não. É possível que eu esteja apenas sendo dramática, como em 2006, quando eu arranhei minha perna pulando o portão da casa de meus avós e pedi, aos prantos, que me levassem ao pronto socorro, já que eu precisava urgentemente – na minha concepção – de uma injeção antitetânica.
Desenvolvi um gosto compulsivo pela leitura de bula de remédios – ainda que seja vitamina C – e, ao ler que o efeito colateral da ingestão de determinado medicamento é náusea, reclamo de desconforto antes mesmo de sentir o incômodo. Embora as pessoas cresçam como as árvores, gradativamente e em direções diferentes, mantive algumas características de meu broto. Se no âmbito profissional nasci para letras, no âmbito pessoal nasci para o teatro.
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