Aluno 113
1 Versão
Costumo
dizer que iniciei tardiamente minha vida como leitor. Na infância, não fui um
leitor assíduo das fábulas e das histórias em quadrinhos, como O Gato e a Lebre ou A turma da Mônica. Lia algo aqui e ali,
poucas vezes em casa ou na escola, nas séries iniciais do ensino fundamental,
mas nada tão decisivo na minha vida como leitor. Observo que a leitura poderia
ter sido mais presente dentro de casa durante a infância. Nesse sentido,
Rottava (2000) argumenta que “a família também não deve deixar somente para a
escola o papel de despertar, incentivar e motivar a leitura.”.
Já
com certa idade, por vias de terminar o ensino fundamental, integrei-me ao
grupo de contação de histórias que se iniciava na escola. Mesmo não tendo um
contato marcante com a leitura em um primeiro momento da vida, intuí que seria
algo interessante, que me propiciaria aprendizados, já que as atividades seriam
desenvolvidas dentro da biblioteca, célebre espaço no ambiente escolar, onde os
alunos tem convívio com os livros e a leitura de maneira mais próxima. Contudo,
esse espaço é, muitas vezes, mal explorado dentro da escola, uma vez que falta
aos professores um planejamento que inclua a leitura no processo de
aprendizagem. A abordagem de leitura adotada pelos professores, sobretudo com no
ensino fundamental, segundo o que pude observar em meus anos de escola, está
restrita a treinar a compreensão leitora e desenvolver uma habilidade de
leitura. (cf. Rottava, 1998)
A
atuação do grupo dava-se na realização de pequenos saraus temáticos na biblioteca
da escola. Em encontros, anteriores aos saraus, o grupo reunia-se juntamente
com as professoras responsáveis para a seleção dos textos e das performances
que seriam feitas pelos integrantes. A autonomia quanto à escolha do repertório
foi sendo construída ao longo dos meses. Recordo-me do sarau intitulado
“Literatura sem preconceito”, em que nossas orientadoras deram asas às nossas imaginações
e permitiram que todos os textos fossem de livre escolha de nós alunos. Naquele
período, eu começava a ter conhecimento da obra de Luís Fernando Veríssimo. Lia
suas crônicas no jornal e outras aleatoriamente nos exemplares de seus livros
que ficavam na biblioteca. Para aquele sarau escolhi a crônica “Livros”, porque
nela o autor defende, de forma muitíssimo bem humorada, a supremacia do livro
diante de outras atividades da vida cotidiana, como assistir televisão, ir ao
cinema e até fazer sexo.
A
meu ver, a crônica era apropriada para o contexto em que seria lida, em razão
de estar inserida em um sarau temático, dentro de um espaço de leitura, voltada
para um público que se quer formar leitor – colegas de escola das séries finais
do ensino fundamental. Por isso, a leitura do texto de Luís Fernando Veríssimo
constrói um sentido nesse cenário. Rottava (2000) explica que “sentido é algo
que é construído no processo de interação verbal entre interagentes (reais ou
virtuais) e em decorrência de uma situação comunicativa em que se encontram.”. A
escolha e a leitura dos textos, primeiro coletivamente dentro grupo e
posteriormente para os assistentes dos saraus como performances pode ser
entendida como uma prática social da leitura, que segundo Rottava (2000)
“envolve o propósito de que ler é utilizar-se da linguagem para determinado
objetivo, bem como para alguém e em certas circunstâncias.”.
A
escolha daquela crônica não foi por acaso, afinal “o leitor não é um sujeito
neutro” (Rottava, 2012). Ao ler que “o livro leva nítida vantagem sobre todas as outras formas de
divertimento caseiro” (Veríssimo, Luís Fernando. Livro. Folha de São Paulo,
29/07/12), passei a refletir sobre que postura queria adotar dali para diante
como leitor. Além de compartilhar minhas leituras, queria também tornar-me um
leitor mais assíduo, mais próximo da leitura, lendo crônicas, romances,
histórias em quadrinhos, o que quer que fosse. Entendo a escolha desse texto e
sua exposição no sarau temático como o sentido construído por mim a partir da
leitura, quis dizer algo para o público e para mim mesmo. Rottava (2012)
observa que “no processo de construção de sentidos há sempre um “querer dizer”,
um propósito que o leitor toma para si em uma tarefa de leitura; essa tarefa
ocorre em um contexto em que a leitura é parte de uma situação mais abrangente.”.
A partir dessa visão, concluo que a leitura do texto dentro da situação
abrangente – a apresentação do grupo de contação de histórias no sarau – foi
marcante porque o conteúdo do texto esteve entrelaçado com uma prática social
da leitura, oportunizando-me não só expandir os sentidos construídos para os
demais colegas, assistentes do sarau, como também uma reflexão interna sobre
minha vida como leitor.
Referências:
ROTTAVA, Lucia. A leitura em contexto acadêmico: o processo
de construção de sentidos de alunos do primeiro semestre do curso de Letras.
Santa Cruz do Sul, v.37 n.63, jul.-dez.,2012, p.160-179.
ROTTAVA, Lucia. A leitura e a escrita na pesquisa e no
ensino. Espaços da Escola, Ijuí, Editora UNIJUÍ, a.4, n.27, jan.-mar., 1998,
p.61-8.
ROTTAVA, Lucia. A importância da leitura na construção do
conhecimento. Espaços da Escola, Ijuí, Editora UNIJUÍ, a. 9, n.35, jan.-mar.,
2000, p.11-6.
VERISSIMO,
Luís Fernando. Livro. Folha de São Paulo, 29/07/2012. Disponível em <http://aliteraturanaescola-helena.blogspot.com.br/2012/07/luis-fernando-verissimo-livro.html>
Acesso em 09/06/16.
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