terça-feira, 28 de junho de 2016

CONSTRUINDO HISTÓRIAS, CONTANDO SENTIDOS

Aluno 113
Reescrita


Já com certa idade, por vias de terminar o ensino fundamental, integrei-me ao grupo de contação de histórias que se iniciava na escola. Mesmo não tendo um contato marcante com a leitura em um primeiro momento da vida, intuí que seria algo interessante, que me propiciaria aprendizados, já que as atividades seriam desenvolvidas dentro da biblioteca, célebre espaço no ambiente escolar, onde os alunos tem a oportunidade de um convívio com os livros e a leitura de maneira mais próxima. A atuação do grupo dava-se na realização de pequenos saraus temáticos dentro desse espaço.
Em encontros, anteriores aos saraus, o grupo reunia-se juntamente com as professoras responsáveis para a seleção dos textos e das performances que seriam feitas pelos integrantes. A autonomia dos integrantes quanto à escolha do repertório foi sendo construída ao longo dos meses. Recordo-me do sarau intitulado “Literatura sem preconceito”, em que nossas orientadoras deram asas às nossas imaginações e permitiram que todos os textos fossem de livre escolha de nós alunos. Naquele período, eu começava a ter conhecimento da obra de Luís Fernando Veríssimo. Lia suas crônicas no jornal e outras aleatoriamente nos exemplares de seus livros que ficavam na biblioteca. Para aquele sarau escolhi a crônica “Livros”, porque nela o autor defende, de forma muitíssimo bem humorada, a supremacia do livro diante de outras atividades da vida cotidiana, como assistir televisão, ir ao cinema e até fazer sexo.
A meu ver, a crônica era apropriada para o contexto em que seria lida, em razão de estar inserida em um sarau temático, dentro de um espaço de leitura, voltada para um público que se quer formar leitor – colegas de escola das séries finais do ensino fundamental. Por isso, a leitura do texto de Luís Fernando Veríssimo constrói um sentido nesse cenário, nos termos de Rottava (2000), que define construção de sentido como “algo que é construído no processo de interação verbal entre interagentes (reais ou virtuais) e em decorrência de uma situação comunicativa em que se encontram.”. A escolha daquela crônica não foi por acaso, afinal “o leitor não é um sujeito neutro” (Rottava, 2012). Ao ler que “o livro leva nítida vantagem sobre todas as outras formas de divertimento caseiro” (Veríssimo, Luís Fernando. Livro. Folha de São Paulo, 29/07/12), passei a refletir sobre que postura queria adotar dali para diante como leitor. Queria tornar-me um leitor mais assíduo, mais próximo da leitura, lendo crônicas, romances, histórias em quadrinhos, o que quer que fosse.
Rottava (2012) observa que “no processo de construção de sentidos há sempre um “querer dizer”, um propósito que o leitor toma para si em uma tarefa de leitura; essa tarefa ocorre em um contexto em que a leitura é parte de uma situação mais abrangente.”. A partir dessa visão, concluo que a leitura do texto dentro da situação abrangente – a apresentação do grupo de contação de histórias no sarau – foi marcante porque o conteúdo do texto esteve entrelaçado com uma prática social da leitura, oportunizando-me não só expandir os sentidos construídos para os demais colegas, assistentes do sarau, como também uma reflexão interna sobre minha vida como leitor.
Dada essa experiência ainda no ensino fundamental, é de grande satisfação deparar-me agora no ensino superior com concepções teóricas de práticas leituras que vão ao encontro daquilo que desenvolvi com meus colegas, sem ter muita consciência. Evidentemente que as professoras responsáveis por conduzir o grupo tinham a clara noção do intuito do projeto e do que queriam alcançar, todavia, para os integrantes do grupo, o aparato teórico e pedagógico do projeto estava em segundo plano, sendo a leitura o que mais nos saltava aos olhos. Como estudante de licenciatura, que participou do grupo de contação de histórias e que agora estuda a prática de leitura como teoria, vejo como indispensável a adoção de tais metodologias integradoras, como contação de histórias, leituras coletivas, saraus, para que os estudantes possam construir sentidos com suas leituras e expandir suas visões de mundo.





Referências:

ROTTAVA, Lucia. A leitura em contexto acadêmico: o processo de construção de sentidos de alunos do primeiro semestre do curso de Letras. Santa Cruz do Sul, v.37 n.63, jul.-dez.,2012, p.160-179.
ROTTAVA, Lucia. A leitura e a escrita na pesquisa e no ensino. Espaços da Escola, Ijuí, Editora UNIJUÍ, a.4, n.27, jan.-mar., 1998, p.61-8.
ROTTAVA, Lucia. A importância da leitura na construção do conhecimento. Espaços da Escola, Ijuí, Editora UNIJUÍ, a. 9, n.35, jan.-mar., 2000, p.11-6.
VERISSIMO, Luís Fernando. Livro. Folha de São Paulo, 29/07/2012. Disponível em <http://aliteraturanaescola-helena.blogspot.com.br/2012/07/luis-fernando-verissimo-livro.html> Acesso em 09/06/16.


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