Aluno 113
Reescrita
É sempre um choque de
realidade quando você sai daquela rotina que está acostumado e parte para algo
diferente. Foi assim que aconteceu comigo lá pelos quinze anos quando saí da
escola do meu bairro para cursar o ensino médio e ter meu primeiro emprego. Antes
disso, nada era tão sério, levava em tom de brincadeira quando alguém dizia que
a vida no futuro seria mais difícil, que a relação com as pessoas iria demandar
muita paciência.
Por decisão dos meus
pais, fui ter minha primeira experiência de trabalho. Não por uma necessidade,
eles queriam mesmo é que eu não tivesse tempo livre, como eles diziam “cabeça
vazia pensa besteiras”. No primeiro momento achei chato, sem graça, não tinha o
tom de brincadeira que via antes. Ainda assim encarei. Minha função? Aprendiz
do setor comercial de uma empresa de serviços de comunicação. Primeira mudança:
eu, tímido, sem ter muito o que falar, recém-saído da segurança de casa, teria
que falar. E falar muito, quatro horas por dia, com todos os tipos de pessoa
que precisassem de mim.
Chegando à empresa,
vi aquelas salas separadas por vidros, padronizadas, com mesas, computadores e
telefones para todos, pessoas compenetradas em suas tarefas. Meu trabalho
concentrava-se sempre ao telefone, atendendo muitos clientes por dia, às vezes cinquenta
ou sessenta pessoas em uma única tarde. Gente de cidades diferentes, idades
diferentes, rotinas diferentes. Houve dias em que eu só esperava pelas seis da
tarde, hora de ir embora, cansado de tanto falar, de ouvir respostas como “eu
quero cancelar”, “não quero mais o serviço de vocês”. Isso sempre me chamava a
atenção, quem eram essas pessoas que os clientes chamavam de “vocês”, estaria
eu incluído? Demorei a entender que sim, eu estava incluído e a partir do
momento que telefonava e falava em nome da empresa eu passei a ser a empresa,
do ponto de vista que eu era a personificação do serviço que os clientes
contrataram, afinal, não se pode reclamar para um pequeno aparelho eletrônico
ou para o controle remoto. Entretanto, eu via como injusto que toda a
indignação dos clientes fosse destinada para mim, um ser humano, que estava
fazendo seu trabalho e em nada tinha a ver com o que estava acontecendo. Essa
rotina de estar permanentemente em contato com muitas pessoas foi me modificando
aos poucos e para melhor, porque eu sabia que não podia mais reproduzir aquele
tipo de comportamento se eu não queria estar sujeito a ele.
Houve uma inversão de
papeis. Passei a me colocar no lugar dos atendentes de telemarketing que sofrem
agressões verbais todos os dias. Jamais deixei de ser solícito com algum que
ligasse para minha casa depois disso. Comecei a prestar mais atenção nas
pessoas ao meu redor, descobri que não dói sorrir para quem te atende na loja,
no mercado ou em qualquer estabelecimento, eles são seres humanos desempenhando
seu trabalho. Desde então sou mais solícito, mais educado. Depois dessa
experiência, vejo que meus pais tinham razão, lidar com outras pessoas requer
muita paciência.
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