Aluno 113
1 Versão
É sempre um choque de
realidade quando você sai daquela rotina que está acostumado e parte para algo
diferente. Foi assim que aconteceu comigo lá pelos quinze anos quando saí da
escola do meu bairro para cursar o ensino médio e ter meu primeiro emprego.
Antes disso, nada era tão sério, levava em tom de brincadeira quando alguém
dizia que a vida no futuro seria mais difícil, que a relação entre pessoas
requereria paciência.
Por decisão dos meus pais,
fui ter minha primeira experiência de trabalho. Não por uma necessidade, eles
queriam mesmo é que eu não tivesse tempo livre, como eles diziam “cabeça vazia
pensa besteiras”. No primeiro momento achei chato, sem graça, não tinha o tom
de brincadeira que o menininho via antes. Ainda assim encarei. Minha função?
Aprendiz do setor comercial de uma empresa de serviços de comunicação. Primeira
mudança: eu, tímido, sem ter muito que falar, recém-saído da segurança de casa,
teria que falar. E falar muito, quatro horas por dia, com todos os tipos de
pessoa que precisassem de mim. Como era de se esperar, foi mesmo um choque de
realidade.
Chegando à empresa, eu
olhava para os lados e não via quase ninguém da mesma idade que eu. Um ou dois
colegas também aprendizes, mas ainda assim me sentia sozinho, sem saber o que
fazer, como agir, como me comportar, que palavras usar. Bastava que alguém
mencionasse meu nome pra que eu pensasse logo em sair correndo gritando “eu
quero a minha mãe!”, mas não havia essa opção. Meu trabalho concentrava-se
sempre ao telefone, atendendo muitos clientes por dia, gente de vários lugares,
várias idades, várias vidas.
Lidando essa multiplicidade,
me deparava sempre com situações com as quais eu não estava acostumado a lidar.
Pessoas mal-humoradas, com a voz carregada de raiva e braveza, que não queriam
saber de nada, não queriam saber de nada e eu ali, “desculpe senhor, só estou
fazendo o meu trabalho”. Encontrei também pessoas muito solícitas, com a voz
leve, eu podia sentir que falavam sorrindo. Essa rotina de estar
permanentemente em contato com muitas pessoas foi me modificando aos poucos e
para melhor.
Houve uma inversão de
papeis. Passei a me colocar no lugar dos atendentes de telemarketing que fazem
milhares de ligações por dia sofrendo agressões com palavras todos os dias.
Jamais deixei de ser solícito com algum que ligasse para minha casa depois
disso. Comecei a prestar mais atenção nas pessoas ao meu redor, vi um mundo
todo que não via antes. Descobri que não dói sorrir para quem te atende na
loja, no mercado ou em qualquer estabelecimento e que é muito gratificante
receber de volta. Desde então sou mais solícito, mais educado, mais humano.
Depois dessa experiência,
vejo que meus pais tinham razão, lidar com outras pessoas requer muita
paciência. Hoje eu lembro com muito carinho do período porque me serviu de
grande aprendizado, aprendi a me relacionar com os mais diferentes tipos de
pessoas e perdi o medo que tinha delas. Quando sorrio para alguém me sinto
leve, não tem razão para guardar sorrisos, medir abraços, elevar a voz, nada
disso. Melhor mesmo é uma boa conversa, em tom de brincadeira, sem pensar que a
vida é mesmo um sacrilégio e que só estamos aqui para enfrentar problemas. Além
de enfrentar problemas, estamos aqui para criar soluções. Boas ações podem sim
atrair boas ações, é nisso que acredito. Já estou fazendo a minha parte.
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