terça-feira, 21 de junho de 2016

Aluno 86
Reescrita


Crescer em uma família como a em que cresci, contribuiu significativamente na formação da pessoa que sou hoje, de modo que seria impossível fazer uma apresentação pessoal sem relacionar com tal fato. A criança curiosa que se desenvolveu no meio de tanta informação, hoje disfruta de tudo aquilo que construiu movida pela vontade de saber qualquer coisa, o máximo de coisas que fosse possível.
            Durante toda minha infância e adolescência, fui instigada pelos meus pais a questionar, descobrir o significado das coisas que eu não conhecia. Na maioria das vezes o fazia procurando nas páginas do meu dicionário influenciada pela minha mãe que sempre esteve ciente da minha curiosidade, noutras vivenciando situações novas e buscando nelas experiências de aprendizado. Até hoje quando não sei o significado de alguma coisa, lembro-me dela dizendo: “Cadê o teu dicionário? Busca que a gente vai descobrir!”. Na maioria das vezes o fazia sem hesitar, mas como qualquer criança, em determinados momentos tinha pressa para descobrir o que eu queria, tentando acelerar o processo. Ou seja, tentava fazer com que ela me dissesse o que tal palavra significava sem ter que me dar ao trabalho de fazer a pesquisa. Minha mãe, nunca dava o braço a torcer. Quem o fazia era eu, que consumida pela curiosidade ia atrás do dicionário o mais rápido possível para acabar com aquela angústia logo! Assim, cresci sabendo que eu poderia dominar qualquer assunto se o estudasse com afinco, se me interessasse em ir atrás das respostas eu mesma.
            A paixão pela leitura aconteceu com a maior naturalidade possível. Alguns livros ganhava do meu pai, às vezes em inglês em razão das viagens que ele fazia a trabalho e do conhecimento que ele tinha do meu interesse por essa língua. Outros eu ganhava de professoras, que percebiam minhas frequentes visitas e empréstimos na biblioteca. Tudo isso somado aos livros da estante de casa, com obras que meu irmão e minha irmã leram, foram o suficiente para que eu tivesse cada vez mais interesse por aquelas palavras que só me faziam querer descobrir cada final de cada título instigante que eu encontrasse pela frente.
            Através dessa curiosidade que me move até hoje, e principalmente o incentivo da minha família, pude alcançar um dos meus maiores objetivos: estudar em uma universidade pública de prestígio. Minha mãe sempre disse que eu deveria cursar Letras ou Direito, meu pai sempre quis que eu estudasse na UFRGS independentemente do curso. Mas uma criança cujo passeio preferido era ir à livraria e que nunca perdia sequer uma Feira do Livro, não poderia ter outro futuro que não a Faculdade de Letras. Lembro-me com clareza do sábado que se seguiu após minha primeira ida à Feira do Livro com a minha turma de quarta série da escola. Meus pais tinham uma reunião com outros criadores de chinchilas como eles em uma fazenda no topo de uma colina na beira do rio em Guaíba. Acompanhada de três aquisições feitas no dia anterior, passei a manhã e a tarde debaixo da sombra de uma árvore. Ao final do dia, tinha lido os três livros inteiros, que não eram tão pequenos assim, para a surpresa dos amigos dos meus pais. Estes não se surpreenderam tanto assim, pois já estavam acostumados comigo devorando livros em casa.
            Pergunto-me se eu seria a mesma pessoa caso não tivesse todo o incentivo que tive.  Hoje posso dizer aqui, nessa apresentação, que sou muito mais do que uma criança grande e curiosa, apreciadora da literatura. Sou a 86 de 22 anos, grata por todas as oportunidades de estudo, de leitura, de descobertas, principalmente de vida que tive, e extremamente feliz com as escolhas e as pessoas que me guiaram até aqui.

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