Aluno 92
Reescrita
Nos meus tempo de infância, eu passei
por várias situações divertidas e memoráveis, mas uma em especial me
proporcionou uma visão diferente sobre como agir em situações adversas: o dia
em que venci um torneio de Ping pong.
Eu tinha cerca de doze anos. Estudava
numa escola municipal que fica na mesma rua da minha casa. Nas terças e quartas
tínhamos educação física, que se resumia ao professor amigão da galera deixando
os alunos livres pela escola com uma bola de futebol e uma de vôlei. A regra
era clara: façam o que quiserem, só não quebrem as coisas. Numa dessas manhãs
ensolaradas da educação física, a diretora, Dona Adriane, senhorinha muito
simpática, apareceu contente dizendo que tinham conseguido algo novo para os
alunos. Eu, que não fazia parte nem da turma do vôlei nem do futebol, estava
jogado em um banco, quase morrendo de calor.
Eu e mais alguns amigos fomos ver o
que era e lá estava ela, a mesa de Ping pong. Aquele pedaço de madeira
desgastada, meio velha, e aquelas duas raquetes vermelhas que pareciam
pirulitos gigantes se tornaram a obsessão da gurizada do turno da manhã. Em
pouco tempo, parte da turma do futebol e da turma do vôlei se transformou na
turma do Ping pong.
Eu era um dos mais viciados. A regra
jamais discutida pelos colegas era que o vencedor permanece na mesa até ser
derrubado. Permanecia por várias rodadas ali, impassível, até cansar ou algum
espertalhão notas meus padrões, então largava a raquete, fazia alguma piadinha
e voltava direto pro fim da fila.
Depois de mais ou menos um mês de
puro fanatismo e jogos valendo bolacha trakinas, o professor Thiago, queridão
da galera, passou de sala em sala pra avisar que a direção decidiu promover um
torneio de Ping pong. O vencedor ganharia um ingresso para a Expointer.
Passagens inclusas. Era, e ainda é um costume nas escolas municipais de
Alvorada, levar os alunos para tal passeio. Era um prêmio simbólico, mas o que
realmente nos importava eram as já clássicas medalhas douradas de um e noventa
e nove, que normalmente saiam do bolso do próprio professor de educação física,
e ele fazia questão de dar em todos os campeonatos.
No dia do campeonato eu cheguei
sério. No dia anterior eu tinha passado a tarde inteira em uma lan house do
bairro assistindo vídeos de Ping pong. Tinha lido em algum lugar que os
campeões são focados o tempo todo, então fui para a escola no máximo de minha
concentração. Com a cara fechada e minha camiseta do naruto, eu me sentia um
verdadeiro guerreiro.
Meus primeiros jogos foram
tranquilos. Colegas afobados e com pressa de ganhar. Eu respirava devagar e
devolvia os golpes de raquete com calma. Eu já tinha jogado com todos eles,
então era apenas uma questão de lembrar dos pontos fracos e evitar meus padrões
de sempre.
Minha estratégia de calma e
serenidade eventualmente me levou até a final. Meus amigos, que já tinham sido
eliminados, torciam pro oponente, pra variar. Depois de beber um pouco de água,
peguei minha raquete vermelha e esperei. Enquanto descançava os braços
cansados, do outro lado estava o Guilherme. Guilherme, vulgo churrasco, era
conhecido na escola por ser o melhor jogador de xadrez. Já tinha vencido todos
por ali e ido competir em Porto Alegre. Perdeu, mas mesmo assim era mais
habilidoso que todos nós. A confiança habitual nos olhos, e aquela camiseta do
Dragon ball que ele usava me diziam que seria uma partida difícil. Churrasco
era um jogador muito agressivo. Completamente o meu oposto. Jogar com ele me
dava dor de barriga. Quase não me deixava tempo pra pensar. Ele já tinha
entendido meu estilo de jogo e não ia me dar tempo pra reagir. Depois de perdeu
o primeiro set de maneira vergonhosa, entendi que deveria ser mais agressivo.
Quando o jogo seguiu, e minha dor de
barriga aumentou, aumentei meus ataques. Alternava entre simples devoluções
suaves da bolinha com raquetadas ignorantes, dignas de um ogro. Depois de
vencer um set por muito pouco, e de
quase ensurdecer com o coro quase uníssono dos meus colegas dizendo que eu já
havia perdido, percebi o ponto fraco do churrasco: as pontas. Ele quase sempre
errava as bolinhas nas pontas da mesa. Tudo o que eu tinha que fazer era bater
com a raquete mais rápido e enviar a bolinha mais veloz do que o braço daquele
moleque frenético consegue alcançar nas extremidades da mesa.
Foi esse jogo com o churraasco que me
fez ver as coisas de uma maneira diferente. Eu ficava apenas esperando as
jogadas dos adversários e devolvia com raquetadas na mesma intensidade. Isso
funcionou com jogadores medianos, mas logo que enfrentei alguém que realmente
sabia o que estava fazendo, quando encarei um problema realmente grande,
entendi que essa estratégia de passividade não funciona para todas as
situações. Mesmo que a palavra tenha uma conotação negativa no uso do
dia-a-dia, naquele dia eu aprendi a ser agressivo. A agressividade é uma ferramenta
que podemos e devemos usar em momentos propícios. Naquele dia eu entendi que
não existe vencedor na passividade. Era um simples jogo de ping pong mas me
passou certo aprendizado que ainda ronda
meus pensamentos constantemente.
Agressivo, com raquetadas fortes e
certeiras, venci. Minha medalha comprada no mercadinha silenciou a voz dos meus
amigos, e eu e o churrasco vimos os bois na Expointer.
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