terça-feira, 28 de junho de 2016

Trabalho ilegal

Aluno 76
Reescrita


Para ler ao som de “Clandestino”, de Mano Chao)

O despertador toca às 5h. Ignoro. Às 5h20, Romildo me sacode. “Anda, Rafa, senão vamos nos atrasar.” Coloco a primeira roupa que vejo pela frente, pego um iogurte na geladeira e saio. É o meu primeiro dia de trabalho como pedreiro em Berlim.
Eu estava na capital da Alemanha para um intercâmbio e, há tempos, andava desanimado com o jornalismo. No meio disso tudo, surgiu essa oportunidade na construção civil. Quando meu anfitrião na capital alemã, Mario, de cidadania portuguesa, mas angolano de nascimento, me propôs o trabalho de pedreiro, pagando 5 euros a hora, eu achei uma troca justa. Por dia, daria uma média de 50 dinheiros europeus.
Às 5h30, o trem chega. Vou conversando no caminho com Romildo, goiano, colega de apartamento e agora também de trabalho, que jurou que eu não aguentaria nem uma semana na obra. “Tava difícil, né, Rafa. Tranquei a faculdade. E tava de saco cheio de trabalhar no telemarketing daquela operadora de celular.”
Mal chegamos na construção, e já vêm as primeiras ordens. “Polaco, faz isso.” “Não é polaco, é brasileiro”, explicam. “Polaco brasileiro faz aquilo”, corrije um dos chefes. Passo a ser conhecido como o polaco brasileiro. Na primeira hora de batente, acho tudo muito engraçado e até me divirto.
Às 9h30 começa o primeiro intervalo. Estou esgotado, mas feliz. A dor muscular é parecida com a de duas horas de treino pesado na academia. Sento num canto sozinho. Com o meu atraso e a correria para sair de casa, esqueço de preparar um lanche. A obra fica num lugar bem afastado da região central de Berlim, e não há nenhum lugar por perto onde eu possa fazer uma refeição. Romildo gentilmente me cede um pedaço de seu sanduíche. Agradeço e aceito.
Voltamos a trabalhar às 10h. Por enquanto, a minha tarefa consiste em levar de um lado para o outro ferros, tijolos, sacos de areia. Dói o corpo. Já são 11h, e estou podre. O próximo intervalo é só ao meio-dia. Sento um minuto para descansar. (Queria tanto um café brasileiro nessa hora, mas não tem nem alemão.) Mario berra comigo. “Vamos polaco brasileiro”, diz ele, meio que sério, meio que brincando. Dou um sorriso e tiro forças não sei de onde para voltar. Aguento até o meio-dia, hora do segundo intervalo. Não tenho almoço. Acho injusto pedir um pouco da comida de Romildo, preparada no dia anterior com esmero. Olho para o meu amigo e penso: tu tinha razão. Eu, difinitivamente, não aguentaria. Então, peço as contas.
Volto pra casa, tomo um banho e durmo até as 18h. Vou ao supermercado e preparo o melhor jantar possível. Espero Romildo e Mario com a mesa posta. O bife do polaco brasileiro, jornalista e que não deu conta do trabalho de pedreiro, recebe elogios.

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