quarta-feira, 22 de junho de 2016

O que me torna eu

Aluno 87
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Há não muito tempo, eu gostava de me perguntar: “Quem eu sou? Do que sou feita? Por que existo?”, perguntas que acredito já terem passado pela mente de bastante gente. Eu costumava pensar muito sobre isso e cheguei a uma conclusão boba e, talvez, meio infantil. Mas ainda não sei o que poderia me definir melhor: “Eu sou feita de palavras”.
Para me entender, é primeiro preciso saber que eu tenho duas irmãs, a Fabiana e a Daniela. Somos realmente muito próximas. Quando eu tinha quatro anos, Dani me ensinou a ler. Passávamos muito tempo juntas fazendo isso, então eu adorava. Meu pai, professor de Língua Portuguesa e de Língua Alemã, era meu ideal de inteligência a ser alcançado, porque eu acreditava que inteligência era leitura – bobeiras de criança. Aos cinco eu já tinha vários livros, adorava ler para Dani, mas detestava a Fabiana, porque brigávamos muito. Ela não tirava notas maravilhosas na escola, então eu me considerava mais esperta e achava que tinha que ser inteligente e que precisava ler muitos livros. Eu fui crescendo, Dani saiu de casa – faculdade – e isso me quebrou, pelo menos por alguns meses. Como eu disse, passávamos muito tempo juntas. Essa separação me aproximou da Fabiana, que hoje é uma das pessoas mais indispensáveis da minha vida.
O que isso tem a ver com eu ser feita de palavras? Tudo. Quis me tornar mais esperta do que a Fabi para mostrar que eu podia, aprendi a ler pra impressionar a Dani, tudo isso me mostrou o caminho da literatura. O mais engraçado é que essas coisas de criança de “eu leio mais rápido do que tu!” e “eu sou mais inteligente” não passam de uma ilusão que criamos – ninguém é mais inteligente e não importa realmente a velocidade com a qual lemos. Mas eu era criança, crianças têm dessas coisas. Mais acostumada a não viver o tempo inteiro grudada à minha irmã, eu percebi que sentia um prazer enorme lendo. Assistindo a animes e a desenhos animados também.
A noite mais decisiva da minha vida como aspirante a escritora foi quando eu sonhei com o Ash e a Misty, de Pokémon, presos em uma caverna. Eu nem me lembrava mais do nome dela, só a chamava de “menina ruiva”. No sonho, eles se perdiam por causa de uma tempestade. Acordei muito interessada naquilo e, a partir de então, sempre antes de dormir, eu desenvolvia um pouquinho mais a estória. Sempre um pouquinho mais. Até que um dia coloquei no google “Ash e a minha ruiva de Pokémon”. Descobri o mundo das fanfics, que são estórias que os fãs de determinados livros, seriados ou afins criam sobre isso. Depois de alguns meses lendo fanfics diariamente, eu escrevi o meu primeiro capítulo. Ao colocar aquele “continua” no final, eu percebi que Letras era o meu curso. Que eu queria, mais do que tudo no mundo, ser romancista.
A primeira pessoa a ler, é claro, foi a Dani. Ela disse “tá bom pra quem em onze anos” e eu me indignei por dentro. Achei que tinha escrito o novo Dom Casmurro, que era uma obra-prima! Reli anos depois e eu escrevera “durmiu”, mas ainda sinto um carinho enorme pelo texto. Quanto mais eu escrevia, mais relacionava a escrita à gramática. Aprendi colocação pronominal, aprendi as regras da crase, aprendi como usar a vírgula, aprendi as classificações, qualquer regra que caísse à minha frente. Eu achava que escrevia melhor a cada norma aprendida. Isso é uma ilusão que eu compreendo agora. Saber escrever não é conhecer a gramática. Conhecer muitas regras ajuda, é claro, mas quem sabe gramática não necessariamente sabe escrever um romance. Aprendi isso também, principalmente nessa minha primeira semana de curso.
Enfim, eu amo criar situações com personagens de diferentes personalidades e jogar com isso. No começo, havia dois personagens possíveis: o bom e o ruim. O bom sempre ajudava todo mundo e terminava feliz; o ruim sempre fazia maldades sem motivo e terminava preso ou arrependido. Agora existem inúmeros traços na personalidade dos meus personagens. Cada um deles reage diferente em determinadas situações, não há bom e não há ruim, existem simplesmente pessoas. Às vezes eu sinto que eles têm vida, que eu simplesmente narro algo que acontece com pessoas que moram do outro lado do mundo – ou aqui perto, dependendo da estória. Talvez quem leia meus textos não os veja assim com tanta realidade quanto eu – provavelmente não –, mas eu sinto que é assim. E eu amo isso.
Eu digo que sou feita de palavras porque eu não me imagino feliz sem uma estória em andamento, sem poder colocar para fora todas essas situações e emoções que eu crio em minha mente. Se eu não pudesse escrever, eu sobreviveria, é claro, mas sempre estaria sentindo falta de alguma coisa. Seria como simplesmente fazer o que eu devo fazer, obedecer, andar, comer, mas não viver mesmo. O que eu sinto ao criar um capítulo novo é algo que eu ainda não experimentei em nenhum outro momento da minha vida. E, honestamente, eu nunca quero ter que descobrir o que aconteceria comigo se eu precisasse parar.

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