terça-feira, 21 de junho de 2016

Roupeiro Cósmico

Aluno 112
1 Versão


O problema de tentar organizar uma mente bagunçada, é que você não pode tocar nos seus neurônios para conseguir ter a imagem dos devidos pensamentos guardados em gavetas e compartimentos separados. Pode não parecer grande coisa, mas a ansiedade é como um carro desenfreado, ganhando força a cada ladeira presente nas nossas emoções conturbadas. Felizmente, minhas roupas estavam gritando por algum ajuste no roupeiro que se via amontoado, feio, inchado de panos para todos os lados, quase tão caótico quanto a minha existência.
Foi numa quinta-feira ensolarada que eu decidi que iria parar de tomar remédios para dormir e começar uma nova terapia: colocas as coisas em seus devidos lugares. Assim, tanto os meus problemas quanto as minhas blusas, foram para a mesma gaveta. Li uma vez em um livro sobre como arrumar as roupas, que nossas roupas carregam um pouco da gente por aí, quase como um fluxo de energia acumulado em fibras de algodão. A autora deixava bem claro que deveríamos por fora qualquer peça que nos fizesse mal ou parecesse não se adequar à nossa alma. Parece conversa de gente que não sabe nada, mas tem um pouco de sentido sim.
 Assim como na vida, você tem que se livrar das coisas que não servem mais. Então, uma boa tática é separar uma caixa de papelão ou um saco plástico por que, obviamente, algumas coisas vão ter que ir embora. Meu roupeiro tem seis portas. Quando você abre as duas primeiras, metade da minha vida cai pra fora: São desenhos, livros, sapatos e casacos num amontoado sem fim. Nas portas do meio, você encontrará as quatro estações do ano muito bem dobradas e com cheiro de canela, graças aos cravos que comprei tentando evitar traças. Por fim, nas portas da esquerda, você encontrará minha infância muito bem conservada ao lado das tantas bolsas e mochilas que não uso mais. A grande diferença entre meu roupeiro e meu cérebro, é que ao menos as roupas eu posso dobrar, as mochilas eu posso doar e os sapatos eu posso organizar. 
Primeiramente, comece pelo começo. Parece estúpido, mas não é.  Resolvi organizar a metade da minha vida que estava na primeira porta. Os desenhos de quando tinha cinco anos eu guardei. Os livros que não me serviam mais, joguei na caixa de doação. Os sapatos e casacos foram devidamente limpados e separados para descartar. Se você quiser que seja um momento ainda mais prazeroso, deixe uma música tocando. Na segunda parte, dobre as quatro estações sabendo exatamente o que quer usar e o que não pode mais. Desapegue do verão passado: Algumas blusas simplesmente não entram mais na pessoa que você se tornou nesse inverno. Coloque o verão em uma prateleira, com vestidos, saias, regatas e talvez algum pijama mais soltinho. Deixe o inverno bem dobrado com moletons, calças, mantas e toucas à mão, de preferência na altura dos seus olhos. A primavera e o outono podem dividir o mesmo espaço, já que são duas temperaturas amenas que pedem um lugar especial para meia-calça, cardigãs, lenços e acessórios.
As roupas de festas e eventos sociais precisam de uma prateleira especial, com muitos cabides para não amassar nada. Seja amoroso com essa parte, pois são dessas roupas que você vai precisar quando for requisitado a impressionar alguém. Na ultima porta, minha infância passou correndo por mim e quase me levou junto para um lugar que nunca mais vou voltar. Tenha consciência disso: seus brinquedos precisam desocupar espaço. Dei uma última olhada na minha Barbie sereia antes de resolver deixá-la sentada no cantinho ao lado de alguns acessórios que ainda vou usar. Não se trata de jogar tudo fora: se trata de saber separar o que é essencial ou não e desocupar espaço que pode ser usado para algo melhor.
Quando finalmente acabou, fiquei parada observando a disposição quase artística da minha bagunça organizada. Ao lado, um saco plástico cheio de roupas que eu guardava por puro comodismo. Uma caixa com livros que nunca leria e nem precisava mais. Bonecas sorridentes que já não me faziam rir. Sapatos empoeirados que não usava há cinco anos. E um peso de vinte quilos que saiu das minhas costas. Essa é a grande beleza de arrumar suas próprias roupas: A falsa sensação de que seus  pensamentos também estão organizados. A grande calmaria de saber que na manhã seguinte você poderá encontrar aquela blusa vermelha que comprou em uma promoção do ano passado e nunca tinha usado por não lembrar onde estava. 

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