segunda-feira, 13 de junho de 2016

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Aluno 71


Desde pequeno o hospital me foi comum. Constantes internações ocorriam; cansativo e doloroso processo que fez parte da minha vida até o meio da minha adolescência. O que causava minhas complicações de saúde é o que me intriga e me faz pensar até hoje em o que o cérebro humano é capaz de fazer e como manifesta o que está oculto em nosso emocional.
Após muitas consultas com diferentes médicos de diferentes especialidades fazendo infindos exames e realizando diversos procedimentos e testes químicos, busquei a ajuda de uma estudante de iridologia (um método de diagnóstico a partir do exame da íris). Essa profissional não me deu um diagnóstico específico, apenas me disse – após consultas psicológicas e observação do funcionamento do meu organismo – que meus problemas físicos eram causados por problemas emocionais, e que esses estavam ligados diretamente à minha mãe – figura de maior importância em minha vida.
Sempre clara, não só para mim, mas àqueles que me observassem também, minha sexualidade foi pauta em diversas rodinhas de conversa. Poucas horas convivendo no mesmo ambiente que eu e qualquer um poderia perceber que eu era diferente dos demais meninos no recinto. Criado em religião um tanto quanto rigorosa e invasiva na vida de seus adeptos, sofri represália ao ser percebido por outros nessa congregação. Durante muito tempo cheguei a me esconder até de mim mesmo. Negava o que era fato, para mim e para outros. Não aceitava minha condição homossexual e tentava não transparecê-la para que a meus pais não provocasse dor, vergonha ou ira; ela era religiosa e ele, homofóbico.
A distância e as complicações nas relações familiares que foram causadas pela minha condição, não aceita e nem exposta ou debatida mesmo quando percebida, estavam fazendo do convívio diário algo insuportável. Certo dia conversei com minha mãe sobre minha vida, sobre o que eu enfrentaria e que essa luta – já diária – deveria começar em casa. Contei a ela minha condição; expus tudo o que vivi sem ter com quem compartilhar, tudo o que sofri sem ter com quem contar e, felizmente, fui acolhido, amado e aliviado de toda a tensão que vivia e, assim, ganhei uma amiga para todas as horas. A compaixão e o amor que recebi dela me pareciam, e ainda parecem, não ter fim; e espero que, de fato, não tenham. Meu pai, de mente ainda muito pequena e de preconceitos agarrados à suas entranhas, ainda está em processo de deglutição do que não foi uma notícia boa, mas, sim, motivo de desavença. Espero que um dia ele consiga desconstruir ela muralha que existe dentro dele e que nos separa entre dois mundos: o meu, com minha mãe, alegria e paz; e o dele, com vergonha, ira e dor.

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