quinta-feira, 9 de junho de 2016

Reagindo a um ataque anual

Aluno 67
Reescrita

Aniversário, ah, o aniversário! Dia de comemorar mais um ano de vida e aproveitar tudo de incrível que cerca este dia de alegrias: festa, comida, felicitações discretas. Sim, apenas as discretas, afinal, passando disso, não se considera incrível, muito menos de alegria e pode levar ao momento que faz o ser humano ser obrigado a passar por um dos maiores constrangimentos da vida moderna: ouvir o clássico “parabéns pra você”. O culpado é o costume bizarro de cantar em grupo - como se um recado nas redes sociais já não fosse suficiente - que a sociedade insiste em conservar e do qual a humanidade ainda não chegou a um acordo sobre como reagir, afinal é como participar de uma luta forçosamente, sem conhecer sequer o mais simples das artes marciais.
O nome não é anunciado, não existe um ritual de apresentação dos lutadores, o ataque simplesmente acontece. O lugar onde se está? Pouco importa, de qualquer forma, ele estará lá: o amigo que desencadeia todo o processo. Pode ser no meio de uma conversa, de uma aula, entre o vai e vem da rotina no local de trabalho, chega o momento em que, ao sentir um inexplicável clima de filme de terror, você olha para ele, que já lhe encara, e numa fração de segundos aquela boca que parece não conseguir mais um segundo manter-se calada profere "Tá de aniversário, vamos cantar parabéns!"
Você foi descoberto e já se encontra acuado pelo grupo que se pretende um coral, mas parece uma gangue furiosa. A princípio a ideia de acompanhar as palmas, como se estivesse desviando de golpes, faz com que participar seja a melhor opção, mas então o questionamento sobre estar cantando parabéns para si mesmo vem à mente, as mãos param de bater e a boca cala. Um sorriso amarelo então toma conta da expressão, os olhos o acompanham fazendo um passeio pelo ambiente: o chão, o teto, o rosto de cada um dali, a torta que ocasionalmente pode estar na mesa. Chega o momento em que aquele sorriso forçado começa a fazer o rosto doer, ficar sério vai parecer antipático e fugir dali é uma hipótese que passa pela cabeça desde a primeira palavra entoada, mas não, não vai precisar, já estão desejando muitos anos de vida e as palmas já estão cessando.
O silêncio finalmente toma conta do local, as pessoas se organizam para dar o abraço, que põe fim àquela situação, finalmente pode se dizer livre do ataque. O sorriso, antes cansado, se abre até com certa sinceridade e o que escuta agora é o som de seu suspiro de alívio ao pensar que por um ano não precisará ouvir aquelas 12 palavras, pelo menos não na condição de atacado. Se aquilo foi uma luta, já era possível ver o juiz se aproximar e, ao erguer seu braço, o declarar vencedor. Mas num instante você cruza seus olhos já brilhantes com os olhos malignos daquele mesmo amigo que lembrou de seu aniversário, ele então faz questão de dizer em alto e bom som que você é tudo e não nada, "então como é que é?", e começa tudo novamente.  
            

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