1ª
Versão
Por Aluno 10 e Aluno 20
A
variação linguística é um fenômeno presente em todas as línguas. Essa expressão
diz respeito às diferentes maneiras como os interlocutores manifestam sua
língua verbalmente, no dia a dia, variando conforme o contexto social, regional
e cultural. Ou seja, mesmo que haja uma norma culta da língua portuguesa
registrada em gramáticas tradicionais, na prática os falantes do nordeste
brasileiro, por exemplo, falam palavras, expressões e construções frasais
distintas dos falantes do sul do país. Da mesma forma, adolescentes se
expressam diferentemente de adultos, e pessoas com baixa escolaridade falam de
modo diferente de pessoas com doutorado.
Em
função da presença de variação linguística na língua, entende-se que esta é um
organismo vivo, sujeita a ser modificada e a evoluir por meio do uso. Consequentemente,
assume-se que as variantes da língua não são erradas, ainda que se diferenciem
da norma culta padrão. Afinal, as variações atendem plenamente às necessidades
de determinado contexto histórico e social, servindo inclusive de instrumento
para a evolução de uma língua.
No
entanto, esse assunto não é usualmente abordado nas escolas, onde apenas a
gramática tradicional é ensinada sem que os alunos reflitam sobre o uso da
língua. Isso gera inúmeras consequências negativas nos estudantes, que criam
preconceitos com relação a quem mais fala distanciado das normas cultas. Além
disso, cria-se uma cultura de certo e
errado na língua, assumindo-se que o certo seria falar e escrever conforme a
gramática tradicional, enquanto que qualquer variação disso seria errado. Quando a escola não reflete
sobre variação linguística com seus alunos, ela ignora o fato de que a língua é
criada pelos falantes, de modo que a classificação certo e errado não pode
existir. No máximo, pode-se dizer que uma palavra ou expressão é adequada ou inadequada a determinado contexto de uso.
A
professora aposentada de Português, Literatura e Redação, Tânia Marques, atuou
durante 28 anos em escolas brasileiras, com regência de classe do Ensino Médio.
Ela afirma que, já na década de 80, era abordado o assunto variação linguística
no curso universitário de Letras. Contudo, em entrevista fornecida por e-mail,
ela reconhece que “[...] na maioria das vezes, isso não é levado em
consideração pelo professor de Português, pelo sistema educacional vigente e
pelos concursos em geral.” (MARQUES, 2014).
A
professora Tânia Marques salienta que a falta de reflexão escolar sobre
variação linguística é grave, pois gera preconceito linguístico entre alunos e
impede que a cultura de um povo se manifeste:
É
muito importante que o professor ou a professora de Português aborde esse
assunto em sala de aula, para que os alunos se conscientizem da existência
dessa variedade ou riqueza linguística em nosso idioma e percebam que essa
diversidade precisa ser aceita por todos sem discriminações ou chacotas, porque
o que realmente importa é o ato de comunicação se completar. Desconsiderar as
variantes linguísticas de um idioma significa rejeitar as diversas
manifestações culturais de um povo. Seus falares estão carregados de sentidos,
de estilos e de liberdade de expressão. (MARQUES, 2014).
A
partir do momento que os falantes revelam seu contexto social e sua cultura por
meio da língua, deixar de manifestar as variações linguísticas é limitar a cidadania
das pessoas. Muitas vezes, em escolas da periferia das cidades, os alunos têm
uma maneira bem diferente da norma culta para se comunicar e é assim que eles
se expressam no meio social e cultural em que vivem. Dizer que essa maneira de
comunicação é simplesmente errada é
tirar dessas pessoas o direito que elas têm de exercer a sua cidadania. Por
isso, a professora Tânia concorda com o sociolinguista Marcos Bagno, e faz a
seguinte colocação:
Atualmente
o prof. da UNB, Marcos Bagno, trata com muita competência e propriedade desse
assunto. Por meio de sua obra, este autor tenta derrubar o preconceito
linguístico existente em nossa sociedade e mostrar que todos devem ser
respeitados. Mesmo aqueles que não sabem reproduzir as normas cultas da língua
ou as reproduzam de outro modo exercem a sua cidadania. (MARQUES, 2014).
Quando
questionada sobre o impacto de se estudar variação linguística nas escolas,
Tânia Marques afirmou que, quando atuava como professora, sempre buscava trazer
o assunto à sala de aula, conforme pode ser visto no trecho a seguir da
entrevista:
Enquanto
professora de Português, sempre levava para as aulas exemplos dessa
diversidade, assim como solicitava aos alunos trabalhos de pesquisa “in loco”
os quais deveriam estabelecer paralelos entre a norma culta e outras variações
de determinadas palavras, por exemplo, (pesquisa bibliográfica, fotográfica e
sonora) para mostrar o quão distante a escola está da realidade da maioria dos
brasileiros.
(MARQUES, 2014).
Entretanto,
a professora de Língua Portuguesa expõe que, em geral, a variação linguística
não é abordada em ambiente escolar. Ela acredita que essa realidade precisa
mudar urgentemente, porém isso não se resolverá apenas inserindo o assunto nas
aulas de Língua Portuguesa. Conforme trechos reproduzidos a seguir, a
professora Tânia Marques afirma que é necessária uma mudança geral no contexto
do ensino público, de modo que todas as disciplinas abordem a variação
linguística e respeitem a sua manifestação:
Abordar
o assunto “variedade linguística” na escola é uma urgência interdisciplinar,
porém isso não será suficiente para causar impacto, visto que, como a nossa
escola pública é tradicional, é alienante, é massificadora, ela necessita mesmo
de uma mudança geral de paradigmas curriculares, de abordagens metodológicas,
de conteúdos programáticos e de critérios de avaliação.
[...]
O
tema deve ser discutido e vivenciado por professores de todas as disciplinas,
já que as variações linguísticas estão em todos os locais, em todas as épocas,
em todas as culturas, em todos os conteúdos da vida. (MARQUES, 2014).
É
evidente por meio da entrevista que, desde muito tempo, professores de Língua
Portuguesa estudam variação linguística na universidade, entendendo esse
fenômeno ao se graduarem. Todavia, as escolas brasileiras, em especial as de
ensino público, não abrem espaço para que os alunos reflitam sobre sua língua,
apresentando a gramática tradicional de forma impositiva.
Muitas
vezes, os próprios professores são preconceituosos, tachando como errado o modo
de alguns alunos se comunicarem e propagando a cultura de que brasileiros não
sabem falar português corretamente. Essa realidade gera mais preconceito na
sociedade e dá margem para que o uso da língua atribua mais ou menos valor às
pessoas. Ou seja, aqueles que falam de acordo com a gramática tradicional e
dominam o idioma culto são vistos como superiores, mas inteligente e mais
capazes.
Para
mudar essa visão preconceituosa, torna-se imprescindível uma mudança de
mentalidade no ensino escolar. Os professores precisam ensinar a gramática
tradicional ao mesmo tempo que refletem com os alunos sobre variação linguística,
nunca menosprezando-a. É importante aplicar cada manifestação da língua no seu
contexto adequado. Assim, os alunos saberão quando devem utilizar a norma culta
e quando podem se comunicar de maneira informal, podendo exercer a sua
cidadania sem sofrer preconceitos.
Referência
MARQUES,
Tânia. [Variação linguística].
Entrevistadoras: F. Santos e J. Córdova. Porto Alegre: [s.n.], 2014. Entrevista
concedida por e-mail.
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