1ª versão
Por Aluno 27
Todos os anos, milhares de alunos adentram as
universidades de todo o país para iniciarem sua vida acadêmica. Muitos destes,
após a aprovação no vestibular, queimam polígrafos de cursinho e agradecem por
jamais terem que fazer cálculos, estudar biologia ou ainda ler Gregório de
Matos e Machado de Assis. Estes últimos, trazem como razão para seu desgosto
com os autores a linguagem, a temática das obras ou simplesmente “literatura é
muito chato”.
Neste contexto de leituras obrigatórias e alunos que
cada vez menos se interessam pelos livros, podemos nos perguntar: literatura
serve para quê mesmo?
Em entrevista com jovens inseridos em diversas áreas
do conhecimento, pudemos perceber que essa questão apresenta-se de formas muito
diversas.
Para Adriana Kerchner, 18 anos, aluna do curso de
Letras da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a literatura tem a
missão de transmitir através da escrita a cultura e os saberes de um povo.
- Dessa forma, eles podem transmitir para as gerações
futuras seus valores, mitos, crenças, toda e qualquer informação que eles
desejem imortalizar nas páginas de um livro. – afirma ela.
Guilherme Dias, 22 anos, publicitário graduado pela
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), tem a sua visão sobre o tema muito
próxima de Adriana, mas salienta que nós, vivendo no século XXI, também
possuímos influências do que fora produzido anteriormente.
- Acho que boa parte dos entretenimentos “modernos”
não existiriam se ninguém tivesse escrito romances há séculos atrás. Até as
redes sociais são basicamente pessoas escrevendo biografias romantizadas em
pequenas partes.
A concepção apresentada pelos jovens está muito
próxima da exposta na obra de Antoine Compagnon, grande crítico literário e
professor de Literatura Francesa no Collège de France, em sua obra “Literatura
Para Quê”, quando ele elenca alguns sentidos dados à literatura. Um deles parte
de Aristóteles e sua idéia de literatura como representação, possuindo assim um
poder moral. Desta forma, segundo aponta Compagnon, “a literatura deleita e
instrui”.
A idéia da leitura literária como uma forma de
entretenimento é apresentada por Karine Leal, 23 anos, estudante do curso de
Medicina Veterinária na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
- Há também a importância de se permitir um momento
de descanso a cada livro que se lê e poder entrar na fantasia da história.
Assim, percebe-se um encontro entre a noção de
deleite e transposição do real para o imaginário, algo muito presente
principalmente na literatura infanto-juvenil a partir do século XX. Muitos
professores, com o objetivo de instruir seus alunos com determinado assunto,
acabaram por escrever obras fantásticas que abordam uma temática de uma forma
jamais vista antes. Jostein Gaarder, escritor norueguês teve seu início no
mundo da escrita desta forma, quando, para incentivar o interesse em suas aulas
de filosofia, escreveu “O Mundo de Sofia”, obra lida até hoje por milhares, e não
mais apenas crianças.
Tantos outros exemplos existem e em todos, a noção da
representação de uma dada realidade, seja ela no mundo das idéias ou no real,
de um futuro apocalíptico ou em um passado desconhecido, todas possuem o
objetivo de transmitir uma idéia, uma moral. Além disso, deve-se considerar que
o período e as condições sociais e históricas de quem e onde as escreveu é de
extrema importância, indo de encontro com o que a estudante de Letras, Adriana,
disse anteriormente sobre a transmissão de saberes de uma cultura através da
obra literária escrita.
Uma questão levada em consideração no decorrer das
entrevistas foi em relação do que cada um dos entrevistados entendia por
literatura.
Apesar de apresentarem idéias diversas de outros
parâmetros, todos os entrevistados concordaram em um ponto: a literatura faz
parte da dimensão escrita.
Guilherme vai mais longe nisso quando diz que é
exatamente a dimensão escrita que faz do leitor tão atento, permitindo adentrar
o enredo de forma inigualável.
- É clichê, mas a literatura realmente é uma porta
para um outro mundo. Um livro exige a plena atenção do leitor, e assim que ele
tem esta atenção, poucas coisas conseguem te tirar de dentro das páginas. Com a
televisão e o cinema, sempre existe aquele ator que fez aquele outro filme, ou
um efeito especial um pouco esquisito. Já o livro, na minha opinião, força a
imersão dentro da tua própria imaginação de uma maneira que nenhuma outra arte
consegue replicar.
Ao final de cada entrevista, foi perguntado a cada entrevistado
quais eram os livros favoritos deles. O interessante do resultado foi perceber
que pessoas de áreas tão diversas (Letras, Publicidade e Medicina Veterinária)
possuem algo muito forte em comum: todos possuem como livro favorito pelo menos
um considerado “clássico”. Na lista estavam, dentre os muitos, Dostoiéviski,
Machado de Assis, George Orwell e Érico Veríssimo. Da dimensão mundial para a
local, apesar das escolhas profissionais diversas, foi possível perceber que o
gosto pela leitura e a literatura ultrapassaram as aulas de cursinho e seguiram
vida afora, permitindo que, segundo Compagnon, pudessem tornar-se pessoas mais
sensíveis, sábias e portanto melhores.
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