terça-feira, 15 de julho de 2014

Memorial de Leitura

Reescrita
Por Aluno 42


“ A leitura deve provocar no leitor uma reação. Essa, por sua vez, permitirá que sejam emitidas opiniões, pois aceitar ou recusar um tema ou um assunto é, muitas vezes, o ponto de partida para a construção do conhecimento”
Lucia Rottava (2000)




Introdução

Escrever um memorial de leitura tem sido um tanto quanto difícil, por ter que buscar lembranças do que se acreditava perdido, esquecido.
Segundo Maria Divanira (2007, p.2), “ Memorial é um gênero textual que registra trajetórias de vida” e ainda que: “ [...] acompanha o caminhar de alguém[...], aspectos que marcaram sua trajetória[...]”.
Para compor este memorial, busquei a partir dos conceitos acima, trazer fatos relevantes e histórias que julguei importantes para minha formação enquanto leitora.
 As histórias em quadrinhos da Turma da Mônica e do Chico Bento, as fábulas da Branca de Neve e Chapeuzinho Vermelho também fizeram parte da minha infância. Na adolescência, O Presente precioso, de Spencer Johnson foi o mais marcante. Um livro de poucas páginas, com letras grandes e que contava a história de um rapaz e de um velho que o ensinara o valor do presente, do hoje, do agora.

O Presente Precioso não é uma coisa que alguém lhe dá. É um presente que         você dá a si mesmo. O rapaz estava confuso, mas determinado. Resolveu descobrir o Presente Precioso por si mesmo. E assim…Arrumou as malas e partiu de onde estava. E foi a outros lugares, a procura do Presente Precioso. Ele não sabia porque aconteceu. Apenas…aconteceu! Ele compreendeu que o Presente Precioso era apenas isso: O PRESENTE. Não o passado, nem o futuro, mas o PRESENTE PRECIOSO. E em um instante, o homem foi feliz! Compreendeu que estava no Presente Precioso. Ergueu as mãos triunfante para o ar fresco. Estava alegre[…] ( JOHNSON, 1994 ).

                                        

Lembro-me que na leitura desta obra, apaixonei-me pelo vocábulo DÁDIVA, que desde então, juntamente com saudade, é minha palavra predileta da língua portuguesa. Não recordo como essa obra chegou até mim, ou como cheguei até ela. Mas foi de suma importância na minha trajetória de leitora.

 A família                           

 Sendo a família a entidade responsável pela socialização primária, acredita-se que antes mesmo da escola, seja ela a primeira responsável por introduzir os filhos ao mundo da leitura; sendo a escola então, responsável pela socialização secundária.
Meu pai mal sabia escrever o próprio nome, mas lia. Por diversas vezes o vi sentado com seus livrinhos de bang bang e faroeste; as páginas eram meio amareladas, pareciam recicladas. Minha mãe, não havia terminado o ensino fundamental, que na sua época era chamado de curso ginasial, quase não lia, exceto a bíblia e suas deliciosas receitas culinárias. No entanto me presentearam certa vez com uma bíblia infantil, que tinha cerca de cinquenta páginas, era colorida e cheia de figuras e a capa era vermelha.
Apesar da situação familiar, os pais sempre torceram e incentivaram seus cinco filhos ao estudo. Desejavam que fossem “mais”; que jamais deixassem de estudar, chegando ao nível superior e a uma formação que eles mesmos não puderam ter. Batalharam para que material escolar não faltasse. Foram os incentivadores primeiros dos filhos. Sobre o papel da família, Rottava em seu artigo que trata da importância da leitura, expressa o seguinte:

[...] a família também não deve deixar somente para a escola o papel de despertar, incentivar e motivar a leitura. Grande parte dessa responsabilidade é também dos pais, que devem proporcionar aos seus filhos o acesso às publicações e incentivá-los à leitura. Além disso a família precisa ter presente a ideia de que a leitura perpassa todas as ações e tarefas realizadas dentro de casa, tais como ler o rótulo de um alimento, ler um manual de instrução, uma revista ou jornal, dentre outras, bem como incentivar à prática constante da escrita. (ROTTAVA, 2000, p. 13).


            A escola
      
Meu percurso escolar deu-se em escola pública e, enquanto leitora iniciou-se na primeira série. Lembro-me perfeitamente da cartilha, que eram os livros didáticos com os quais as crianças eram ensinadas a formarem palavras juntando sílabas; eram ilustradas e coloridas. Diferentemente de outras turmas, do primário, éramos nós, a primeira série, a única turma com um professor homem. Ele se chamava Júlio César; um homenzarrão de quase dois metros de altura, de uma doçura incontestável. Jamais o esqueci.
Da cartilha, que mais gostava de ler e cantar eram o texto ”O cravo e a rosa”; bem musical, fora usado para que a turma aprendesse os encontros consonantais (br e cr) e a letra (r). Assim era o pequeno texto: “ O cravo brigou com a rosa, debaixo de uma sacada. O cravo saiu ferido e a rosa despedaçada; [...] o cravo teve um desmaio e a rosa pôs-se a chorar.”
A leitura e a escrita faziam parte dos meus entretenimentos prediletos desde a infância. Na adolescência, escrever poesias nos diários coloridos e cheirosos (coisas de adolescentes dos anos 90) fora um dos meus passatempos favoritos. A caligrafia tornou-se importante, pois no diário minha letra teria que ser bem redondinha e bonita. Sobre isso, Rottava diz o seguinte a respeito da prática da leitura e da escrita:
                                        
 Ler e escrever são particularmente indissociáveis pois podem ser vistos como evento social, no qual os leitores, do mesmo modo como os escritores, compartilham pensamentos e ideias e, particularmente objetivos afins que os constituem também produtores de conhecimento. (ROTTAVA, 2000, p. 14).


Apesar do gosto pela leitura, à medida que a adolescência foi chegando, os gibis e as fábulas foram ficando de lado. Lia somente o que era necessário para os trabalhos escolares e para as provas. As leituras obrigatórias de autores renomados como Gonçalves Dias e Machado de Assis eram maçantes para uma adolescente do ensino médio.
Nessa época surgiram os poemas e através de Luís Vaz de Camões conheci “Amor é fogo que arde sem se ver.” Decorei o soneto e não cansava de recitá-lo, mesmo sem saber o que significavam aquelas metáforas. Na adolescência então, preferi poemas a romances, graças a Camões. Através deste poema de amor, meus pensamentos divagavam através das metáforas.

 Lê-se para deleite pessoal, fruição, entretenimento, como quando se pega um livro ou uma revista e deixa-se que o pensamento flua sem nenhum compromisso ou objetivo além do prazer de ser e de experimentar situações, ambientes, acontecimentos. (BRITO, 2012, p. 29).

Foi então através dos poemas que, na adolescência pude “experimentar situações de prazer” com a leitura.

Ensino Superior

Se no ensino médio as leituras obrigatórias eram poucas e o tempo era demasiadamente muito, atualmente no ensino superior, ocorre o inverso: muitas leituras para pouco tempo. Algo bom também aconteceu: como leitora aprendi a gostar e deleitar-me nos romances e não somente nos poemas.
Romances, contos, poemas, ensaios, crônicas são lidos aos montes na faculdade de letras e fazem, portanto parte do meu cotidiano, já que sou aluna deste curso, na UFRGS. Claro que não gosto de tudo o que preciso ler, mas gosto de tudo sim, no sentido de que gosto um pouco de cada estilo. Gostando ou não, a obrigação prevalece sobre o gosto.
A maturidade ensinou-me a ter mais comprometimento com aquilo que desejo, sonho e quero. Kleiman tem a dizer o seguinte:

O gosto não é a manifestação de determinações biológicas ou genéticas nem fruto de uma aprendizagem autodirigida e imanente; gosto se aprende, se muda, se cria, se ensina[...]. Inevitável, contudo, é viver a contradição: estimular a livre escolha não é errado, mas tampouco é a totalidade; certamente, é errado dizer que o que o leitor escolhe é bom e basta; a promoção da leitura não pode submeter-se ao mimetismo do imediato, devolvendo a cada um o que lhe já é conhecido; ela precisa buscar um diferencial- a potencialidade de abrigar o conhecimento humano. [...] A especificidade da leitura está na condensação de conteúdos, na atitude reflexiva introspectiva de exame de si e das coisas com que interage, no auto controle da ação intelectual. E, também, vale a pena repetir, na inclusão do sujeito num determinado “modo de cultura” e na disseminação de hábito, práticas e forma de cultura mais densas e elaboradas. (KLEIMAN, 2004, p. 29-31).


No ensino superior, já tive a oportunidade de conhecer e aprofundar-me em obras de autores consagrados mundialmente. Leituras mais densas, consideradas um tanto quanto difíceis, mas sem deixarem de ser gratificantes, fazem parte da rotina diária de uma estudante de letras; como os poemas de Graciliano Ramos, Manuel Bandeira, Marina Colasanti e Clarice Lispector; Em busca do tempo perdido, de Marcel Proust; Memórias do subsolo, de Dostoiévski; Lucíola do José de Alencar; Bodas de sangue, de Federico Garcia Lorca; Cem anos de solidão, de Gabriel García Marques; Madame Bovary de Gustave Flaubert; entre outros que vem marcando minha trajetória universitária e enriquecendo-me culturalmente.

Considerações finais

A leitura é uma das formas de busca de conhecimento. Enquanto houver vida essa busca não acaba jamais.
Ao reportar-me para um passado não muito distante, vejo o quanto a leitura foi capaz de proporcionar-me conhecimento, liberdade de expressar-me com convicção e confiança. Enquanto cidadã do mundo, sinto-me cada dia mais dinâmica e consciente. Entende-se a leitura como uma forma de inserção social e cultural; mas para que isso ocorra de maneira completa, é necessário que leitura e compreensão ocorram concomitantemente.


Referências Bibliográficas

ARCOVERDE, M. D. L. et al. Produzindo gêneros textuais: o memorial, 22 ed, Campina Grande; Natal, 2007, p. 1-12.
BRITTO, L. P. L. Nuances: estudos sobre a educação, Ano XVIII, v.21, n. 22, jan./ abr. 2012, p. 18-32.
GASPAR, M. M.G. S. et al. Memorial- Gênero textual (auto) biográfico, mundo, p.13
            KLEIMAN, A. B, Abordagens da leitura, Scripta, Belo Horizonte, v.7, n. 14, 2004, p. 13-22.
           ROTTAVA, L. A leitura e a escrita na construção do conhecimento. Espaços da Escola, Ijuí, Editora Unijuí, a. 9, n. 35, jan. / mar. 2000, p. 11-16.

          ____________. A leitura e a escrita na pesquisa e no ensino. Espaços da Escola, Ijuí, Editora Unijuí, a. 4, n. 27, jan. / mar. 1998, p. 61-68.

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