1ª
Versão
Por Aluno 10
Frequentemente
eu presenteio minha avó com livros. Como ela gosta muito de ler e, em função da
idade, não pode sair para escolher materiais de leitura, sempre que eu passo em
alguma livraria faço questão de procurar romances para ela. No entanto, esta é uma
tarefa relativamente difícil para mim, pois minha avó é alemã e só lê
literatura nesta língua, enquanto que eu sei muitíssimo pouco de alemão. Desse
modo, costumo ler os títulos e as sinopses dos livros. Se entendo um pouco do
que se trata e me parece interessante, eu compro o exemplar.
Um
cuidado especial que costumava ter, entretanto, era o de não escolher livros
que tratassem de temas ligados à guerra. Acontece que minha avó veio para o
Brasil após sofrer vários anos como fugitiva da Segunda Guerra Mundial e eu
sempre escutei histórias horríveis sobre quando os soldados russos invadiram o
território alemão e sua família teve de presenciar mulheres sendo abusadas,
pessoas sendo torturadas e inúmeras crueldades com crianças. Por um milagre,
minha avó e seus parentes sobreviveram, e ela pôde fugir para o Brasil com seu
marido, onde se estabeleceu. Ainda assim, conforme meu conhecimento de alemão
permitia, eu tentava evitar que os livros a fizessem lembrar desse período de
sofrimento.
Uma
noite, porém, quando fui à livraria escolher literatura para minha avó, só
sobrou uma opção de livro após excluir as obras que eu não sabia do que se
tratavam e aquelas que eu já tinha adquirido. Chamava-se “Contos russos de
amor”. Eu comprei o exemplar, mas fiquei um tanto receosa de dá-lo como
presente, por se tratar de histórias do povo russo, aquele que minha avó tinha
visto fazer tantas barbáries. Assim, achei melhor consultá-la antes de lhe
entregar a obra. Expliquei que eu só tinha encontrado aquele título, mas que se
ela não se sentisse bem em ler literatura russa eu poderia
procurar novos livros em outros lugares.
Para
minha surpresa, ela respondeu: “Mas por que eu não ia me sentir bem? Assim como
tiveram russos muito maldosos, também existiram russos muito bons e um deles
até salvou minha vida. O problema não é a nacionalidade de alguém.”. Quando ela
disse isso, eu me lembrei de uma história que ela havia contado há muito tempo sobre
um russo que abriu sua casa para minha avó e a escondeu por vários dias,
enquanto soldados procuravam alemães naquela região para os matar. E, daí, eu
me dei conta de que, só por saber alguns acontecimentos da guerra, eu havia
escolhido enfatizar a maldade dos soldados russos e criar um preconceito para
com esse povo. Minha avó, por outro lado, mesmo tendo presenciado tantas
crueldades, escolheu se lembrar de uma atitude positiva que um russo teve para
com ela e preferiu nunca julgar um povo inteiro por causa da atitude de alguns.
No
momento em que eu ouvi aquela resposta, fiquei impressionada por minha avó não
guardar qualquer mágoa do povo russo. Todavia, aprendi naquele instante que,
independentemente da origem das pessoas, sempre existirão indivíduos com bom e
mau caráter. Quando minha avó aceitou tranquilamente o livro que lhe dei, ela
me ensinou que mesmo em uma situação horrível como a guerra, há pessoas dispostas
a fazer o bem. E enxergar isso em vez de notar apenas a maldade é uma escolha
que cada um pode fazer.
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