Reescrita
Aluno 51
Decidimos que seria feito a moda antiga. Com a família reunida em casa, e alguns no quarto para ajuda-la nesse momento tão delicado. Sem médico, sem hospital, em casa. Como costumava acontecer quando essa era a única opção. Estava tudo encaminhado do jeito que deveria ser. A previsão de que aconteceria até no máximo o dia 25 estava correta, visto que estávamos no dia 8. Então era isso, aconteceria hoje. Sem cirurgia, sem hospital, mas naturalmente, como as coisas devem acontecer.
E, começamos a ouvir os gritos. Típicos gritos de dor, ou seriam de alívio? Não sei. Mas eram gritos. Gritos que fizeram com que nós, que estávamos aguardando na sala, entrássemos no quarto para tentar oferecer qualquer tipo de conforto a ela. E, de certo modo, conseguimos. Ela estava ofegante como qualquer mulher em sua situação estaria. Suava e se esforçava para que aquilo acabasse logo, pois já não aguentava mais de dor. Ninguém aguentava.
Estávamos cansados daquela tensão, inclusive mais cansados do que ela. Porém sabíamos que aquilo já iria passar, que em poucos minutos a dor que ela sentia iria embora, os gritos iriam calar. E assim aconteceu. Depois de algumas horas ali, trabalhando duro, lutando por aquela vida, ela finamente conseguiu. O silêncio, então, tomou conta do quarto, e principalmente, dos nossos corações.
Não era nascimento. Era morte. Não eram gritos de alívio, ou até mesmo felicidade. Eram gritos de dor. A situação ofegante não acontecia pela tentativa de tirar uma nova vida de dentro dela, mas sim por se despedir da sua própria vida. Nós, como família, sabíamos que nada poderia ser mais traiçoeiro naquela altura da vida dela do que um câncer. Câncer que dói, câncer que cansa, câncer que vence.
E aconteceu. Preencheu o quarto de silêncio, ela de alívio e nós de saudade. Preencheu a vida de sentido, nós de tristeza e ela de saudade. Selou o amor, como um laço que muitas vezes difícil de colocar, sela uma caixinha de presente. E assim, finalmente, ela selou a vida.
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