REESCRITA
ALUNO 145
Meu primeiro contato com a
escrita se deu na primeira série do ensino fundamental, onde finalmente saí do
mundo de colorir desenhos e passei a utilizar as palavras aprendidas no ensino
infantil para criar algo que tivesse um significado maior do que uma casinha
entre duas montanhas e um pôr do sol. Por ser filha de um jornalista, me
fascinava a ideia de escrever um texto que meu pai pudesse ler, assim como ele
fazia com os textos dos repórteres do jornal onde trabalhava, mesmo que na
época eu não soubesse direito a diferença entre escrever um texto qualquer e
escrever uma matéria para ser publicada.
No entanto, nada me dava mais
prazer do que escrever redações sobre como haviam sido as férias, o que tinha
feito no final de semana ou sobre algum assunto aleatório dado em aula. Antes
de entregá-las para a professora, costumava deixar as redações coladas na tela do
computador, seguido de um bilhete
pedindo a opinião de meu pai, que sempre
seguia uma linha mais realista e - no meu ponto de vista de criança - um pouco
cruel, mostrando erros cometidos e cobrando correções. Não foram poucas as vezes que, depois de receber
uma crítica nada aprazível sobre textos em que havia me empenhado muito para
escrever, saía atrás de minha mãe para buscar um nem tão sincero “Que
maravilhoso! Não dá bola pro teu pai, ele é acostumado a ser duro com os
repórteres”. No fundo eu sabia que eram apenas palavras de consolo e que mais cedo ou
mais tarde enfrentaria aquelas observações, feitas em caligrafia sinuosa e
inclinada, nem que fosse apenas pelo prazer de receber a redação das mãos dele
sem nenhuma correção e um costumeiro convite para fazer palavras-cruzadas ou
debater sobre um livro lido recentemente.
Desde então, e a cada dia mais,
fui me descobrindo na escrita e me apaixonando pelo poder das palavras de
modificar situações e pensamentos, porém isso foi me afastando pouco a pouco
dos padrões textuais considerados elementares pelo meu “editor-pai”, adepto do pragmatismo baseado na realidade nua e
crua. Os meus
textos costumavam ser emotivos e, na maioria das vezes, mergulhados em sentimentos e imaginação. Na falta de alguém para dividir meus rascunhos sem
provocar discussões fervorosas entre razão e emoção, passei a enviá-los aos
amigos mais próximos, simpáticos às
minhas histórias cheias de casos de amor mal resolvidos, com voltas e
reviravoltas acabando em finais clichês ou grandes tragédias.
Hoje agradeço por cada correção
de vírgula, tempo verbal e acentuação feita pelo meu pai: sem elas, não teria
descoberto que o aprendizado vem dos erros, e não dos acertos. Entretanto, o
maior ensinamento veio de meus amigos, pois eles me mostraram que o verdadeiro
prazer de escrever não advém de mostrar para o leitor o conhecimento gramatical
que possuo ou quantas palavras rebuscadas sei aplicar em diferentes contextos,
mas sim a importância de cativar a pessoa que está lendo e envolvê-la na
mistura de sentimentos colocados no papel. Erra quem pensa que escrever é um
dom, pois se trata de um longo e
perseverante processo, e acima de tudo, de um exercício de amadurecimento
e imersão total nas palavras.
Nenhum comentário:
Postar um comentário