sábado, 20 de maio de 2017

Inspiração ou Transpiração


REESCRITA
ALUNO 145


Meu primeiro contato com a escrita se deu na primeira série do ensino fundamental, onde finalmente saí do mundo de colorir desenhos e passei a utilizar as palavras aprendidas no ensino infantil para criar algo que tivesse um significado maior do que uma casinha entre duas montanhas e um pôr do sol. Por ser filha de um jornalista, me fascinava a ideia de escrever um texto que meu pai pudesse ler, assim como ele fazia com os textos dos repórteres do jornal onde trabalhava, mesmo que na época eu não soubesse direito a diferença entre escrever um texto qualquer e escrever uma matéria para ser publicada.
No entanto, nada me dava mais prazer do que escrever redações sobre como haviam sido as férias, o que tinha feito no final de semana ou sobre algum assunto aleatório dado em aula. Antes de entregá-las para a professora, costumava deixar as redações coladas na tela do computador, seguido de um bilhete pedindo a opinião de meu pai, que sempre seguia uma linha mais realista e - no meu ponto de vista de criança - um pouco cruel, mostrando erros cometidos e cobrando correções. Não foram poucas as vezes que, depois de receber uma crítica nada aprazível sobre textos em que havia me empenhado muito para escrever, saía atrás de minha mãe para buscar um nem tão sincero “Que maravilhoso! Não dá bola pro teu pai, ele é acostumado a ser duro com os repórteres”. No fundo eu sabia que eram apenas palavras de consolo e que mais cedo ou mais tarde enfrentaria aquelas observações, feitas em caligrafia sinuosa e inclinada, nem que fosse apenas pelo prazer de receber a redação das mãos dele sem nenhuma correção e um costumeiro convite para fazer palavras-cruzadas ou debater sobre um livro lido recentemente.
Desde então, e a cada dia mais, fui me descobrindo na escrita e me apaixonando pelo poder das palavras de modificar situações e pensamentos, porém isso foi me afastando pouco a pouco dos padrões textuais considerados elementares pelo meu “editor-pai”, adepto do pragmatismo baseado na realidade nua e crua. Os meus textos costumavam ser emotivos e, na maioria das vezes, mergulhados em sentimentos e imaginação. Na falta de alguém para dividir meus rascunhos sem provocar discussões fervorosas entre razão e emoção, passei a enviá-los aos amigos mais próximos, simpáticos às minhas histórias cheias de casos de amor mal resolvidos, com voltas e reviravoltas acabando em finais clichês ou grandes tragédias.
Hoje agradeço por cada correção de vírgula, tempo verbal e acentuação feita pelo meu pai: sem elas, não teria descoberto que o aprendizado vem dos erros, e não dos acertos. Entretanto, o maior ensinamento veio de meus amigos, pois eles me mostraram que o verdadeiro prazer de escrever não advém de mostrar para o leitor o conhecimento gramatical que possuo ou quantas palavras rebuscadas sei aplicar em diferentes contextos, mas sim a importância de cativar a pessoa que está lendo e envolvê-la na mistura de sentimentos colocados no papel. Erra quem pensa que escrever é um dom, pois se trata de um longo e perseverante processo, e acima de tudo, de um exercício de amadurecimento e imersão total nas palavras.

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