quarta-feira, 14 de maio de 2014

Ensaio de vida

1ª Versão
Por Aluno 20


Saltimbanco: substantivo masculino que significa artista de feira ou de circo e acrobata. Palavra peculiar que possui uma sonoridade interessante. Seu plural “saltimbancos”, nomeou um musical interpretado por jovens na década de setenta, o qual abordava a história do conflito do proletariado contra os detentores dos meios de produção a partir de uma alegoria teatral em que quatro jovens animais cansados da repressão de seus donos, fogem em busca de sucesso como artistas. Já para mim, “Saltimbancos” é significado de força, persistência e amizade.
Não recordo exatamente a data, sei que foi no ano de 2011, no período do Sarau Literário do Colégio Piratini, no qual cursei meu ensino médio. Todo ano esse evento cultural era realizado com o objetivo de maximizar o conhecimento artístico dos alunos. Minha turma sempre fizera apresentações que se destacavam entre as demais por ser composta por pessoas que sentiam que a dedicação por um trabalho escolar poderia gerar resultados que iam além de notas e boletins. Entretanto, aquele ano seria diferente, tínhamos a vontade de fazer algo melhor, pois aquele era o nosso último ano escolar, nossos últimos atos como alunos de ensino médio.
A proposta era uma apresentação artística que compreendesse o tema “O jovem no palco através das décadas”. Eu e meus colegas quebramos a cabeça para encontrar algum texto interessante e surpreendente para ser representado, quando uma colega sugeriu “Os Saltimbancos”. Muitos foram contra. “Teatro de criança!”, “Animais cantando?”, “Por que interpretar bichos artistas?” – foram diversas as questões levantadas até se obter um acordo geral. Decidimos pelo musical sugerido, uma vez que nenhuma outra ideia surgira.
Os ensaios iniciaram e as desavenças também. Não éramos alunos organizados, uns coordenavam e outros xingavam, a todo o momento a gritaria e a bagunça estavam presentes. Era muito difícil transformar uma turma de trinta alunos em um elenco teatral, sendo que todos eram amadores e estavam em meio de provões e cursinhos pré-vestibular. Não era apenas uma peça, era um musical em que todos os atores interpretavam animais - aqui, talvez o leitor pense o quanto superficial esse sentimento parece ser diante de tantos problemas cotidianos, porém devemos pensar a importância das situações colegiais no momento em que se é apenas aluno. Era o último ano, a época de formatura e o adeus a muitos amigos, precisávamos de alguma forma transformar aquele momento em algo que pudéssemos lembrar de uma maneira saudosa e especial. E acredito que foi isso que nos manteve unidos mesmo diante de tantos obstáculos que a falta de preparo e recursos nos ocasionara. Passávamos tardes debruçados sob uma cena que não dava certo, os mais sensíveis choravam com a possível derrota. Realmente com tantos estresses de um ano de transição do período escolar para a vida adulta, parecia que não seria possível fazer uma apresentação surpreendente.
Com o tempo, a turma foi se acostumando com as falas e canções interpretadas pelos animais. Aquele texto adaptou-se a nossa realidade, tínhamos entrado na história de uma forma que Os Saltimbancos pareciam pertencentes àquela turma de terceiro ano.
O dia da apresentação chegara, todos estavam muito nervosos, com o coração batendo mais forte. Queríamos impressionar, existia uma gana da turma por algo melhor, surpreendente. Os quatro personagens principais, burro, cachorro, galinha e gata, já estavam de figurinos e cara pintada. Pareciam alegorias coloridas no meio dos corredores do colégio. Os outros da turma, que interpretariam e dançariam as músicas teatralizadas, corriam de um lado para o outro para deixar tudo pronto, para que tudo desse certo.
“Senhoras e senhores, com vocês, Os Saltimbancos!”. A apresentação aconteceu e acredito que tenha sido o que passou mais rápido. Agradamos o nosso público, professores e colegas de outras turmas. Fizemos a plateia rir e se emocionar com aquele amadorismo de alunos despreparados para um palco. Tivemos muitas palmas, e nos convidaram para apresentar novamente nos outros turnos de aula. Com certeza, toda essa lembrança é linda para mim e para todos que estavam envolvidos. Entretanto, acredito que não foi a apresentação em si que fez com que essa etapa tenha ficado tão presente em minha memória. Aquele foi um ano conturbado, cheio de compromissos com o colégio, cursinho, a responsabilidade de passar no vestibular e o receio de deixar de conviver com pessoas amigas. “Os Saltimbancos” nos uniu de uma maneira que transformou a turma em uma família, precisávamos estar muito engajados para que aquela apresentação acontecesse e tudo que aprendemos na construção desse pequeno espetáculo, foi o valor da força que um pode fazer em todos e o quanto precisamos lutar para que as coisas deem certo. No fundo, éramos uns saltimbancos mesmo, no sentido da história da trama, ninguém sabia ao certo o que queria da vida, contestávamos tudo e nos achávamos alunos melhores dignos de tentar fazer a melhor apresentação do Piratini. Naquela época, em uma atividade colegial, estávamos aprendendo sem perceber os principais valores de trabalho e persistência para a vida fora dos portões de proteção de uma escola.  

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