quarta-feira, 25 de junho de 2014

A inconstância do prazer pela leitura

Reescrita
Por Aluno 40


Lembro-me bem, quando era bem novinha, por volta dos 7 ou 8 anos, de um quarto grande e cheio de móveis velhos. Nesse quarto havia uma cômoda gigante com gavetas grandes e pesadas, e era em uma dessas gavetas que guardava o maior acervo de livros que já possui. Eram inúmeras histórias, em sua maioria contos de fadas e gibis, histórias que já havia decorado pelas tantas vezes que li e reli. Sem dúvidas, as histórias das princesas da Disney eram minhas favoritas e nunca consegui decidir qual era a minha princesa favorita. Passava horas trancada naquele quarto cercada de livros, interpretando suas histórias e as contando para meus alunos imaginários. Distribuía os livros pelo chão em fileiras, para representar uma sala de aula e por vezes como professora e ou até mesmo no lugar dos alunos, ficava lendo as histórias para esses amigos imaginários. Acredito que esse tenha sido o primeiro contato que tive com o mundo da literatura e o momento em que me apaixonei pela leitura, paixão essa que teve seus desgastes durante os próximos anos da minha vida.
Sinto que há uma certa dificuldade de instigar a leitura na vida das crianças, que por instinto possuem um espirito aventureiro, logo há inúmeras brincadeiras na rua mais interessantes que ficar sentada lendo um livro. Nesse momento o professor seria de grande importância para ensinar a essas criança como desenvolver esse espirito aventureiro nos livros, a capacidade de desvendar um livro. E foi isso que me fez falta no anos seguintes. Encontrei-me novamente com a literatura só nas 7ª e 8ª séries, quando um certo professor de português decretou que teríamos uma hora semanal de aula de leitura, e foi então que conheci Machado de Assis. Comecei a leitura de Memórias Póstumas de Brás Cubas animada, pois enfim ia conhecer um dos grandes escritores brasileiros mas essa animação logo se transformou em frustração, além de ser uma leitura difícil, não era um assunto que me chamava atenção, que me estimulasse a continuar a leitura, então abandonei o livro sem nem mesmo terminar a leitura.  Apesar das aulas de leitura não conseguia sentir aquele amor que tive pelos livros na infância, nesse momento a leitura na maioria das vezes era por obrigação e não por gosto.
Então chegou o ensino médio e as aulas de literatura, logo decretei desgosto pela matéria, as aulas não possuíam nenhuma didática e a professora apenas passava o conteúdo sem dar nenhuma explicação do porquê deveríamos aprender literatura. Porém nessa mesma época fazia sucesso o aclamado best-seller Crepúsculo, aquele romance que traz vampiros e lobisomens no texto. Via em todos os meios de comunicação, nas livrarias e até mesmo as pessoas na minha volta comentando sobre esse livro e como sou curiosa resolvi comprá-lo pra entender por que o mesmo era tão superestimado, e no início da leitura já me apaixonei pela obra. Era uma romance adolescente e eu era uma adolescente passando por todas as mudanças decorrente desse período da vida, era sobre isso que o livro tratava mas de uma forma fantástica o que deixava tudo mais interessante. Passava horas grudada naquele livro e nos próximos da saga, sofrendo com os personagens. Hoje em dia essa saga não tem relevância nenhuma pra mim, mas naquele momento Crepúsculo me deu uma outra perspectiva de leitura. Foi a partir daí que me permiti explorar mais a literatura estrangeira e descobrir o prazer da leitura em romances adolescentes. Enquanto no colégio meu desgosto pela literatura brasileira só aumentava, as aulas eram mal elaboradas e o conteúdo era simplesmente passado aos alunos, sem que fosse desenvolvida uma análise ou criada uma forma de despertar o senso crítico dos mesmos através da leitura.
Foi só no cursinho pré-vestibular, com um professor apaixonado por literatura brasileira e com uma método de ensino completamente diferente do método aplicado no colégio, que comecei a gostar da literatura brasileira. Não sei exatamente em qual momento isso aconteceu, mas quando percebi literatura brasileira era um dos conteúdos que mais gostava de estudar e enfim desconstruí esse preconceito que tinha. A experiência que tive com Machado de Assis quando era mais nova foi revertida e nesse momento já o achava um escritor maravilhoso, me vi apaixonada por Clarisse Lispector e pela poesia de Mário Quintana entre outros escritores brasileiros. Foi nesse momento que decidi que queria aprofundar meus estudos nesse assunto, que desistiria da Psicologia pra tentar vestibular para Letras.
Talvez tenha superestimado o curso, no início me senti um tanto quanto deslocada e tive algumas crises existenciais. Via meus colegas, muitos deles completamente dedicados a vida acadêmica com as leituras todas em dia, e eu correndo pra conseguir terminar pelo menos uma das leituras propostas para semana em cada cadeira. Ficava estressada com a grande carga de leituras impostas e muitas vezes pensei não estar preparada para o curso. Cogitava que a grande culpada disso tudo tenha sido uma falta de incentivo quando mais nova, no momento em que preferia as brincadeiras à estudar ou talvez as professoras no ensino médio que não cobravam uma rotina de estudos. Mas percebo que cada pessoa tem a sua rotina e o seu ritmo de leitura.
Kleiman no texto Aspectos Cognitivos da Leitura (1995) fala que o desconhecimento de nomes de objetos, de conceitos simples ou de aspectos linguísticos pode causar uma incompreensão do texto por parte do leitor. Essas dificuldade são, muitas vezes, encaradas pelos jovens estudantes quando lhe são impostas leituras de acordo com o cronograma de ensino do professor e não com o interesse do aluno seguindo a faixa etária do mesmo. Acredito que para desenvolver o gosto pela leitura o aluno deve ler aquilo que lhe convém, que possa ser compreendido e analisado e não apenas os autores cânones como Machado de Assis, impostos nas aulas de literatura. O conhecimento sobre os autores cânones da literatura é importante, mas para que se possa desenvolver o senso crítico no aluno, deve-se buscar outras leituras além destas.



Referências Bibliográficas

ASSIS, Joaquim Maria Machado. Memórias póstumas de Brás Cubas. Biblioteca Folha, Rio de Janeiro, Ediouro, 1997.
KLEIMAN, Angela. Texto e leitor: Aspectos cognitivos de leitura. São Paulo: Pontes, 1995
MEYER, Stephenie. Crepúsculo. 2. ed. Rio de Janeiro, RJ: Intrinseca, 2008


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