terça-feira, 17 de junho de 2014

Descrição do Processo de Lavagem de Louça por um Ousado

1ª Versão
Por Aluno 37


A pilha de louça suja - um obstáculo intransponível à abertura da água na pia, eventualmente, dado o fato de que ela nunca para de crescer. Analisando este detalhe com uma admirável consciência do seu dever, além de somar que seu odor tornar-se-á desagradável, sua visagem aterrorizante e a louça limpa escassa, ou – na pior das hipóteses – inexistente, uma pessoa decidida chegaria à conclusão que sua limpeza é algo necessário à saúde pública. Ainda assim, além de não ser um trabalho para fracos, nossa fé não pode mover estas montanhas – ninguém além dos de vontade inabalável toma sob as costas tal empresa odisseica.
            Resguardando sua coragem até o ponto do enfrentamento, o indivíduo aproxima-se dela, cauteloso – mede seu tamanho, compara-o com suas forças e tempo disponíveis. Protege-se então com seu avental acolchoado, põe grilhões nos cabelos selvagens quando estes desejam auxiliar o oponente, arma-se de esponja de ou espuma ou de aço, detergente e água escaldante – e, quando de tato sensível, reforça suas mãos com luvas protetoras. Certificando-se que o escorredor aguentará o peso à ele confiado, põe-se aquele ousado ao seu trabalho.
            Primeiramente, classifica ele os utensílios de acordo com a gravidade da sujeira – quase-limpos-mas-não-reutilizáveis, não tão limpos, e os mais sujos do que limpos. Purga suas manchas e dejetos teimosos sempre do mais próximo de seu ideal de limpeza ao extremo oposto – com sua água desligada, antes que extermine um inimigo para enfrentar outro, mais cruel e que não desaparecerá à base de sabão e esfregões (por mais que desejemos), que nos atormenta ao final de todos os meses. Joga os corpos já sem vida naquela vala comum erroneamente chamada de balcão da cozinha, enquanto esperam seu agudo olhar de inspetor do necrotério para aprová-los ou reprová-los na estrada rumo ao seu descanso final – o ralo da pia. Os que ainda encontram-se naquele estado semivivo, passam pelo processo novamente – tantas vezes quantas forem necessárias. Agredida assim (porém não injustamente) nossa porcelana, é após banhada na purificadora água da torneira – tomemos por analogia o rio Lete da mitologia clássica, donde os espíritos bebiam da água do esquecimento, e renasciam ao transpor sua margem.

            Este processo, visto não ser de pouca complexidade, pode sugerir aos não-tão-ousados determinados atalhos – existirão sempre máquinas de lavar louça, trabalhadores versáteis e corajosos que expõe-se diariamente ao que muitos não toleram (vulgarmente chamados de diaristas), e, nos mais graves dos casos, o cesto de lixo ou a janela. Ainda há os dotados de dons teatrais; sob o astuto ardil de emoções fortes, encurtam eficientemente seu trabalho ao entregar a louça ou à porta, ou à parede.

Nenhum comentário:

Postar um comentário