domingo, 29 de junho de 2014

Memórias e fantasmas

  1ª Versão
Por Aluno 12


                  As memórias voam como notas feitas a lápis nos cantos das páginas de um livro sendo apressadamente folheado; e em tais notas pode ser lida a minha história, rabiscada por entre frases impressas e margens em branco dos livros que, dentre os muitos que li, marcaram de alguma forma minha vida ou influenciaram a forma como vejo o mundo. É curioso notar que, em sua maioria, as obras que me despertaram interresse ao longo de minha vida como leitora estão de certa forma relacionadas em seus conteúdos.
                  Tomo por exemplo os livros infantis que lia quando as margens de meus livros ainda tinham poucas memórias, logo que aprendi a decodificar textos – uma das definições possíveis de leitura (ROTTAVA 2000). A temática que até hoje me interessa, de mistério e terror, já estava presente em alguns dos livros que tentava ler sozinha – uns eram contos assustadores escritos para crianças sobre fantasmas tristes, fadas que sequestravam jovens e górgonas da mitologia grega; outros, suspenses que traziam joguinhos de lógica para que se pudesse descobrir o desfecho do livro, muitos dos quais eu podia ler, mas não compreendia o sentido por trás do enredo e seus enigmas. Nesses momentos pedia o auxílio de meus pais, que me estimulavam a refletir sobre o significado do que havia lido e então preenchiam as lacunas que eu, em tenra idade, ainda não compreendia – conceitos, às vezes apresentados de forma suave nas histórias infantis sobre perda e morte, sofrimento, e o uso de lógica para superar adversidades.
                        Quando pequena, tive muita influência dos meus pais para desenvolver um gosto pela leitura, o que pode ter sido um dos fatores que me tornou tão ávida por buscar sentido  profundo em tudo que leio e chegar as raízes dos textos: por que isso foi escrito desta maneira? Que intenções, aprendizados, isso esconde nas entrelinhas? Porém também tive outras motivações para a leitura; percebo que os textos que acabaram por se tornar importantes para mim chegaram apenas mais tarde, quando eu já tinha doze ou treze anos.
                  Esses livros mais significativos sempre me foram indicados por amigos, ou eram sugestões minhas para eles, e no geral, eram obras de ficção infanto-juvenil de temas sobrenaturais. Os vampiros, os lobisomens e os fantasmas acompanhavam a mim e aos meus colegas durante os recreios do sétimo e oitavo anos do Ensino Fundamental; uma conversa levava à outra, um amigo levava a um livro, e um livro levava a outro. Inúmeras foram as vezes que também um livro levou a um amigo – fator que contribuía para que juntos seguíssemos em frente na leitura das sagas Harry Potter, A Mediadora e Crepúsculo, romances que considerávamos grandes, na época. Nem todas essas obras possuem enredos que ainda hoje me sejam atrativos, mas neles reside o fator social, tal como visto em Rottava 2000, que deu à essas leituras um sentido; uma razão, nesse caso sentimental, para serem lidas.
                    A temática do sobrenatural na literatura continuou atraente para mim, e fui buscá-la em outras fontes, dessa vez aproximando-me dos clássicos. Edgar Allan Poe virou uma companhia de noites chuvosas e trovejantes; O Retrato de Dorian Gray virou uma paixão tão grande que estive a centímetros – metafóricamente – de literalmente emoldurá-lo e pendurá-lo na parede. Adaptações de Frankenstein e Drácula deitavam na cabeceira ao meu lado à noite enquanto eu sonhava com as versões originais, e ao descobrir Noite na Taverna, passei a dar mais atençãos aos contos, como os de Maupassant e W.W. Jacobs (é claro, além de conferir os textos que Álvares de Azevedo cita em suas – muitas – epígrafes).
                    É possível perceber que as obras de ficção que opto por ler demonstram um crescente grau de complexidade, ainda que no geral possam ter temas parecidos. Esse crescimento reflete o desenvolvimento dos conhecimentos linguístico, textual e de mundo (KLEIMAN, 1995) que possuo me permitindo maior aprofundamento nos sentidos, tanto objetivos (como de que forma um livro pode refletir a sociedade ou época em que foi escrito), quanto nos subjetivos (metáforas, sentimentos expressos) das obras que leio. Quanto mais enevoada me parece uma história, mais me infiltro nela, como uma traça abrindo seu caminho por entre as páginas, e procuro outras leituras que as complementem. Sempre o fiz, mas hoje, no ensino superior cursando Letras, o faço de forma acadêmica e como futura profissão.
  



Referências
ROTTAVA, Lucia; A importância da leitura na construção do conhecimento In Espaços da Escola;  ano9 n.35, p. 11-16, 2000


Kleiman, Angela;  TEXTO E LEITOR: aspectos cognitivos da leitura. 4ª edição. Campinas, SP:Pontes, 1995

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