Reescrita
Por Aluno 34
O ato de realizar uma faxina semanalmente é
uma tarefa indispensável em qualquer residência. Em um dormitório, onde o
indivíduo dorme, guarda suas roupas, calçados, livros e outros objetos
pessoais, ter o ambiente limpo é indispensável. Além de ser algo higiênico e de
extrema importância para a saúde, um quarto limpo também é mais bonito,
acolhedor e confortável.
No entanto, limpar o quarto, por
mais essencial que seja, é algo que exige muita disposição e ânimo, porque é um
trabalho cansativo e delicado, tendo de arrumar com cuidado alguns objetos, não
deixando nada com pó, gordura ou sujeira de qualquer natureza. Alguns móveis
podem ser mais simples que outros, mas não há de se iludir, pois todos exigem
extrema dedicação. Para que a faxina não se torne algo monótono e sim desperte
no indivíduo um momento de prazer e diversão, há alguns fatores "diferentes"
que podem complementar a tarefa de limpeza, para que esta deixe de ser algo
considerado triste e preguiçoso - e sim um momento de relaxamento.
Para o começo do grande ritual, o
indivíduo está ainda na porta do quarto, com o corpo imóvel e pés colados ao
assoalho de madeira. Agora é o momento de observar o ambiente: dá uma olhada
ampla para as paredes um pouco sujas, a mesa empoeirada, a janela de madeira
com verniz e vidro embaçado de gordura e fumaça da cidade. A planta que está na
estante - coitada da planta! - está morrendo, porque o dono do ambiente não a
rega há semanas. E o tapete do quarto? Era branco até semana passada. Agora
está totalmente encardido.
O indivíduo reflete e faz uma breve
filosofia da situação presente de seu dormitório. Os olhos ficam cabisbaixos a
cada sujeira presenciada; o corpo parece estar caindo também, assim como a sua
auto-estima. O clímax da decepção chega nesse exato momento: é quando a pessoa pensa
ou diz em voz alta, após um longo suspiro e um olhar profundo de seriedade:
-
É hora da faxina.
Passando tais minutos tensos e reflexivos,
junto a esse dizer acima, não há mais volta: precisa-se limpar o quarto.
O tapete será o primeiro alvo da limpeza
e claridade. Que cor ele tinha mesmo? Ah, era branco. Tanto tempo que não
limpava, o indivíduo quem sabe até esquecera. Chega olhando para o tapete com
uma vontade quase incontrolável de ligar a televisão e ficar assistindo a
filmes por toda a tarde, e deixá-lo ali, com aquela tonalidade encardida.
Não, precisa-se limpar o tapete. Haja
paciência para começar. Um momento: como fazer uma faxina sem ouvir música? Eis
o primeiro aspecto fundamental para uma faxina ser mais divertida.
E o tapete é deixado de lado. Primeiro
há de pegar o aparelho escolher uma estação de rádio. Futebol já, às 13:00?
Não, obrigado. Uma das demais emissoras toca algo agradável. Não! Prefere uma
música agitada. Por que não aquele samba de raiz que está na rádio seguinte? Escolhido.
Faxina com samba. E dos bons, dos antigos. Tal estilo musical anima e faz com
que o tempo passe mais depressa, ou seja: aparentemente, o tapete ficará limpo
mais rápido.
O indivíduo pisa no artifício e
ajoelha-se, não para rezar, mas para dar início à limpeza. Tapete branco
precisa ser limpo à mão, com um pano úmido que retire toda a sujeira: pega um
balde com água e, com as duas mãos, retira-se o pano, de forma que esteja já
enrolado para torcer e retirar o excesso de líquido presente; o tapete é para
ficar limpo e não encharcado de água. Sem se levantar, posiciona com força o
pano diante do tapete e, num movimento repetitivo, esfrega, retira as
impurezas, até ver novamente o antigo branco do tecido.
Eis a primeira tarefa cumprida. Em
questão de dez a quinze minutos, em um constante processo de passar o pano
úmido no tecido, a parte do tapete estava concluída. O cansaço começa a ser sentido pelo indivíduo,
o suor respingando sobre os olhos, cabelo praticamente molhado, completamente
oleoso. Contudo, não há tempo a perder, sequer de desistir. A missão da faxina
já começou, portanto, há de vencê-la e não render-se à batalha.
Segunda fase do desafio: a
prateleira. Olha lá a planta que está mais para uma integrante da Família Adams
- que tem os defuntos mais famosos do mundo! Água urgente nas folhas da
coitada!
Após regar e dar uma nova vida à
vegetação, a pessoa pega um pano seco, propício para o pó e, numa verdadeira
dança em que os braços e o corpo vão para cima e para baixo, para frente ou
trás, com o pano como acompanhante da valsa em seus movimentos circulares, lá
vai retirando a sua coleção quase infindável de enfeites de porcelana e, para
finalizar a sua coreografia diante da limpeza, passa pano em toda a estante sem
os artefatos, cuidando as pontas e cantos do móvel, em que a poeira sempre fica
acumulada.
A música que a rádio toca está tão
boa que o indivíduo começa a cantar alegremente. Entretanto, a distração
sobrepõe-se ao cuidado com a porcelana que está em um espaço do quarto antes de
voltar à estante, resultando no verdadeiro “anjo que caiu do céu”: o enfeite de
anjinho, tão bonitinho, despedaçado no chão. Agora, não se vê mais um anjo, e
sim uma bagunça de asas quebradas, corpinho destruído e uma cabeça solta –
diga-se o novo integrante da Família Adams. Num ritual de faxina, acidentes são
imprevisíveis, porém podem sim fazer parte do ato de limpar, pois a faxina não
é apenas prestar atenção nos móveis, e sim no conjunto de um afazer.
Passa-se uma cola nas partes do
anjinho e eis o retorno à estante. Esta está limpa e sem o pó, com os enfeites já
no lugar e uma planta ressuscitada. Após isso, a pessoa passa o pano na mesa,
retirando delicadamente os livros, bonecas, porta-retratos. Tais objetos ficam
em cima da cama enquanto o pó da escrivaninha é extraído.
Alguém falou em cama? Ah, não... Esqueceu
de varrer embaixo dela.
tira
a sujeira que está sob a mesma. De brinde, encontra aquela meia sem par que ele
pensava ter sido roubada do varal há umas duas semanas. Por acaso, quem
roubaria uma meia, sem ter a outra junto? Guarda-se a meia, hora de continuar a
limpeza. Quanto à cama, tudo ok, falta a mesa, a qual ainda não foi retirada
toda a poeira. Pano passado, começando o deslize pelo lado direito, passa reto
para cima, vai para a esquerda e finaliza-se com um movimento circular ao meio
da escrivaninha. Fim de coreografia. Produtinho que dá um cheiro bom, mesa
limpa. Todos os seus respectivos objetos novamente em seus lugares.
Tudo estava bem, calmo e tranquilo, ele
já pensando naquela pipoca de final de tarde e na novela que estava prestes a
começar, até o momento no qual olha para a janela e não consegue ver o que há
lá fora. Não, a pessoa não precisa de óculos: a sujeira dos vidros do quarto
está bem nítida aos seus olhos.
Aos poucos, o indivíduo começa a
passar o pano com os típicos movimentos circulares, e ai dele se colocar os
dedos! Não se deixa marcas de dedos no vidro; nem o indivíduo e tampouco um
integrante de sua família. Com o passar
do pano, a visão mais nítida começa a ficar presente, e já consegue observar como
está o tempo lá na rua, espanta-se com o fluxo de carros, vê pela janela uma
pessoa atraente - nossa, que pessoa linda! Quer ficar ali, observando; numa
faxina também há de ter um momento filosófico e reparador. Caso contrário, ela
perde o seu charme. Tal momento perdura em torno de dois minutos, e logo após
isso, chega de frescura: esquece a pessoa amada anônima que não lhe corresponde.
E vê se fecha logo essas janelas, pois já estão limpas de tanto passar o pano e
a obediência em não colocar os dedos nus no vidro.
No desfecho, um pano úmido no chão é passado e alguma
recolocação precisa de móveis. Tudo está no seu lugar, cheiroso e brilhando: a
planta sorrindo para o mundo outra vez, um tapete com uma nova cor, janelas que
mostram o que há do lado de fora e um anjinho remendado - sendo este agora mais
semelhante a uma miniatura de Frankenstein. O indivíduo, cansado e feliz pelo
fato do seu ritual estar completo, senta-se na cama, aspira profundamente o
perfume do ambiente e dá um leve sorriso de satisfação. Em breve, sua
felicidade é tomada por um ar depreciativo, que é quando lembra-se de que todo
o processo exaustivo será repetido na semana seguinte.
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