quarta-feira, 4 de junho de 2014

Da arte de fazer biquinho – tudo aquilo que se crê necessário para o sucesso

Reescrita
Por Aluno 13


Crianças mimadas comprovam que, em 93% dos casos de suplício, o biquinho é o método mais eficaz para manipular a resposta de seus pais objetivando uma permissão para algo que, em condições normais, eles não aceitariam. Mas essa não é uma condição normal. E o biquinho não é uma técnica qualquer, afinal, utiliza-se do método de persuasão – e por isso é muito delicado lidar com ela. Só deve ser usada como último recurso, por exemplo, “eu quero muito ir dormir na casa da Fulaninha e meus pais já disseram que não” – esse é um caso, realmente, muito delicado e requer que se faça uso da arte do biquinho.
Mas, antes de apresentar essa técnica para vocês, preciso explicar a que se aplicam aqueles 7% de ineficácia. Depois de alguns fracassos, foi comprovado que, em situações de perigo eminente ou possível morte, o biquinho não funcionará, nunca. Os pais têm um sensor de perigo que, quando ativo, faz tanto estardalhaço, com tantas luzes e gritos, que não os permite pensar de maneira razoável – razoável para você, e não para eles. Se você pedir para seu pai “posso ir dormir na casa do meu namorado na Restinga”, por exemplo, seu pai vai proibi-la de o fazer. As luzes começaram a piscar quando ele ouviu a palavra “namorado” – e possivelmente ele não tenha ouvido mais nada depois dela –, então, não importa o quão bem você faça o biquinho, ele não vai funcionar: é uma situação de perigo eminente! – pelo menos na visão dele.

Passemos, agora, finalmente, para a descrição da técnica em si. Ela envolve, não somente a movimentação labial, mas também outras movimentações que muitos amadores, erroneamente, não considerariam parte da técnica. Começo, então, explicando-lhes que o processo de juntar os lábios, piscar os olhos, comprimir o corpo e, quase miando, falar numa voz suave “deixa, vai, por favor, por-favorzinho” não é natural. Ele precisa, portanto, de muito treinamento. Um espelho ajudará nisso. Sentar à frente dele é um bom começo e será muito útil na descoberta do seu melhor ângulo. Assim descoberto, passemos para o treinamento facial. Os músculos do rosto devem estar bem relaxados para que possam se adequar ao movimento suave que os lábios farão. Estes se ajuntarão à frente do rosto, como um botão de rosa, tentando superar, em relevo, o nariz – mas não sobrepondo o lábio inferior ao superior e nem vice versa. O próximo item da lista são os olhos. Eles devem exprimir, ao mesmo tempo, suplício e necessidade. Devem causar, nos pais, uma sensação de urgência que, se desrespeitada, lhes trará arrependimentos. Especialistas nessa arte ainda discutem a relevância de lacrimejos no canto dos olhos como catalizadores desse fenômeno. Particularmente, acredito que lágrimas são muito apelativas e podem causar um efeito contrário.  De qualquer forma, melhor não arriscar. Finalmente: a expressão corporal. O seu corpo diz muito sobre as suas intenções. Na hora do biquinho, ele não deve estar desleixado. Ele deve estar comprimido e, de preferência, com as mãos juntas, palma com palma, diagonalmente posicionadas abaixo do rosto – não tem muita relevância se será diagonalmente para a direita ou para a esquerda. Eis a pose ideal para efetuar o biquinho. Agora só faltará implorar quase miando e, salvo nas condições já citadas, sua petição será aprovada.

Nenhum comentário:

Postar um comentário