Aluno 175
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Por mais que eu ainda não
tenha conseguido assumir definitivamente uma definição de amor para mim em
vinte anos, o atual significado dele na minha vida me deixa muito satisfeita
por ter implicado um grande aprendizado apenas observando pessoas desconhecidas.
Essa história é tão linda e singela que merece ser contada para que, talvez,
assim como eu, outras pessoas queiram usar o fato como exemplo, tomando para si
a minha atual definição de amor.
Eu sempre fui uma pessoa
muito observadora e sociável, do tipo que ama sair para lugares onde estarão
pessoas desconhecidas para serem observadas, nesse sentido não foi diferente
quando Gabriela, minha melhor amiga que carinhosamente chamo de Gabi, ligou num dia de semana qualquer me convidando
para um churrasco que seria no próximo sábado à noite na sua casa, dizendo que
iriam não só nossas amigas em comum, mas também outros amigos dela que eu ainda
não conhecia, logo aceitei o convite e confirmei minha presença.
Chegado o dia do churrasco, fui até a casa da
Gabi e fiz o que sempre faço, já que não sou mais visita e me sinto em minha
própria casa: entrei, peguei um copo com um pouco de cerveja e me juntei a uma
roda de pessoas, algumas conhecidas e outras não, que conversavam e riam no
fundo do porão, de modo que os vi e os ouvi desde a porta da entrada, fui muito
bem recebida, cumprimentei a todos e me apresentei aos que não conhecia.
Nesse momento, entre uma fala e outra observei
um casal desconhecido no canto esquerdo, perto da porta por onde eu havia entrado:
os dois falavam baixo, poucas luzes estavam acessas, de maneira que isso
prejudicava a visibilidade, mas por suas feições e gestos rudes percebi que
estavam discutindo, então continuei a observar, de modo que já estava alheia a
conversa da roda feliz que me cercava, notei que o menino segurava o braço da
menina e que ela se afastava cada vez mais. Discretamente, sai do ambiente
divertido que me rodeava e procurei a Gabi, a encontrei conversando com duas
amigas perto da churrasqueira, nesse momento a chamei e a levei para perto da
cena que acabará de assistir, quando chegamos próximas do casal, minha melhor
amiga suspirou profundamente e me explicou que aqueles eram seus amigos da
faculdade, os quais eu ainda não conhecia e que o Paulo estava dando mais um de
seus ataques de ciúmes com a Renata, porém aquilo já não parecia mais um
simples ataque de ciúmes, pois, nesse momento Paulo parecia fora de controle,
prestes a agredir a Renata, no entanto quando pensamos em tomar uma atitude Gabriel,
cujo nome só fiquei sabendo depois de passada a confusão, que além de colega de
faculdade do casal, era também melhor amigo de Renata, um pouco embriagado, já falava algumas coisas que eu não conseguia
escutar pelo volume da música e pelas conversas paralelas, então eu e a Gabi
nos aproximamos para ouvir e se necessário resolver uma possível briga.
A nossa intervenção não foi necessária, Gabriel
na sua embriaguez falava coisas que imobilizaram Paulo e que deixaram Renata e
os outros, que prestavam sua atenção na cena, emocionados: “ Paulo já chega
dessa tua possessão, eu, como melhor amigo da Renata, não posso mais deixar que
tu continue tomando ela como um objeto, como tua posse, afastando ela de tudo e
todos, eu não sei o que amor, mas isso com certeza não é”, ele continuou: “
amor é quando tu encontra alguém tão especial que não quer interferir no ser
dela, é quando tu prefere ficar de longe assistindo ela existir e isso implica
em não tirar a liberdade, se tu fizesse isso veria a Renata na melhor versão
dela: ela sendo ela, sem a tua imposição, veria ela sendo livre e querendo
ficar contigo de verdade, porque isso sim é amor, é dar tanta liberdade pra
pessoa que ela sente a necessidade de ficar perto de ti e ser livre contigo.”
Quando Gabriel parou de falar eu notei que eu, Gabi e mais umas dez pessoas que
paramos para ouvi-lo chorávamos em sintonia.
Gabriel parou de falar,
largou seu copo e saiu correndo para o banheiro depois de seu desabafo, Paulo
sem falar absolutamente nada, aparentemente envergonhado, e Renata, soluçando
de tanto chorar, foram embora imediatamente e eu me vi alheia a qualquer
movimento que houvesse na minha volta: músicas, conversas e risadas. Parei e
fiquei pensando sobre aquele discurso de um amigo esgotado. E assim, naquela
noite, que tinha tudo para ser banal, através do discurso do Gabriel sobre
amor, eu aprendi a melhor definição desse sentimento entre todas as que ouvi
até hoje: liberdade, por conseguinte me apossei carinhosamente desse significado
e, hoje, quando perguntam a minha definição de amor, eu a conto através dessa
história, dando, obviamente, todos os créditos aos protagonistas dela: o
Gabriel, a sua amizade e a sua embriaguez que o fizeram escolher as melhores
palavras para definir o amor sem limitá-lo.
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