Aluno 152
Reescrita
Nascida em um ambiente familiar de
atitudes conservadoras, desde cedo eu sentia a necessidade de escapar dessa
realidade cercada de ideologias tradicionalistas com os quais eu não me
identificava. Assim, iniciei um processo de íntimo envolvimento com as artes
relacionadas à literatura e ao desenho, mergulhei de cabeça em outros universos
ficcionais e, por fim, construí uma morada criativa e individual na qual habito
até hoje.
Durante
os meus primeiro anos de vida, minha família tentava a todo momento impor as
diretrizes para meu futuro, ao invés de apoiarem os meus sonhos infantis. Era
comum ouvir “Tu tem que ser médica quando crescer, artista não sobrevive no
Brasil”, entre outras frases clássicas de pais que acreditam que só a
estabilidade financeira é capaz de fazer alguém feliz. Eu cresci rodeada por
livros, lápis, papéis, pincéis e tintas, era absolutamente raro eu não estar
com algum desses objetos em minhas mãos. Talvez por isso, nem percebi o momento
em que me afastei do mundo exterior e voltei mais profundamente para dentro de
mim.
Passei
então a desejar que eu fosse sugada, raptada ou até abduzida para alguma das
histórias que eu lia. Eu me imaginava caminhando na rua e um portal mágico
aparecendo na minha frente, me dando a oportunidade de conhecer os mundos que
sempre sonhei, onde eu poderia ser uma pintora famosa, uma incrível domadora de
dragões ou até uma apaixonada princesa. Além disso, outra ferramenta que eu
utilizava para construir meus reinos imaginários era desenhar personagens e redigir
simples narrativas, em que predominavam apenas a minha vontade e não a dos
adultos ao meu redor.
Assim
ocorreram as minhas primeiras experiências com a escrita. As histórias eram
muitas vezes apenas meras cópias do que eu já havia lido pelas mãos de outros
escritores, mas eu não me importava com isso, ou não percebia, pois a liberdade
que sentia era tão grande que, para mim, compensava a falta de originalidade. O
lápis era a minha varinha mágica e meus poderes não tinham limites, portanto,
eu podia desbravar todos os mares do mundo apenas escrevendo essas aventuras,
que em minha mente, eram muito mais grandiosas do que as que apareciam nos
livros de história da escola, sobre Colombo e Cabral.
O
passar dos anos e das leituras me fizeram aprender a dialogar com meus pais,
saber construir bons argumentos e lutar pelos meus objetivos, o que afinal era
esperado, já que eu havia travado e vencido batalhas muito mais difíceis com os
monstros da minha imaginação. Com essa maior abertura familiar, eu não precisei
mais me esconder e viver feliz apenas nesses pequenos mundos fictícios, o que
também não significa que abandonei-os completamente. As visitas se tornaram
mais escassas, mas a profundidade dos pensamentos aumentou, por conta das
exigências da vida adulta. Hoje tenho a certeza que minha mente sempre será o
meu lar, meu pequeno baú de tesouros, onde guardo desejos e busco inspirações
para as obras escritas e desenhadas que ainda me aventuro a fazer.
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