quinta-feira, 1 de junho de 2017

CASTELOS DE TINTA E PALAVRAS

Aluno 152
Reescrita



Nascida em um ambiente familiar de atitudes conservadoras, desde cedo eu sentia a necessidade de escapar dessa realidade cercada de ideologias tradicionalistas com os quais eu não me identificava. Assim, iniciei um processo de íntimo envolvimento com as artes relacionadas à literatura e ao desenho, mergulhei de cabeça em outros universos ficcionais e, por fim, construí uma morada criativa e individual na qual habito até hoje.
            Durante os meus primeiro anos de vida, minha família tentava a todo momento impor as diretrizes para meu futuro, ao invés de apoiarem os meus sonhos infantis. Era comum ouvir “Tu tem que ser médica quando crescer, artista não sobrevive no Brasil”, entre outras frases clássicas de pais que acreditam que só a estabilidade financeira é capaz de fazer alguém feliz. Eu cresci rodeada por livros, lápis, papéis, pincéis e tintas, era absolutamente raro eu não estar com algum desses objetos em minhas mãos. Talvez por isso, nem percebi o momento em que me afastei do mundo exterior e voltei mais profundamente para dentro de mim.
            Passei então a desejar que eu fosse sugada, raptada ou até abduzida para alguma das histórias que eu lia. Eu me imaginava caminhando na rua e um portal mágico aparecendo na minha frente, me dando a oportunidade de conhecer os mundos que sempre sonhei, onde eu poderia ser uma pintora famosa, uma incrível domadora de dragões ou até uma apaixonada princesa. Além disso, outra ferramenta que eu utilizava para construir meus reinos imaginários era desenhar personagens e redigir simples narrativas, em que predominavam apenas a minha vontade e não a dos adultos ao meu redor.
            Assim ocorreram as minhas primeiras experiências com a escrita. As histórias eram muitas vezes apenas meras cópias do que eu já havia lido pelas mãos de outros escritores, mas eu não me importava com isso, ou não percebia, pois a liberdade que sentia era tão grande que, para mim, compensava a falta de originalidade. O lápis era a minha varinha mágica e meus poderes não tinham limites, portanto, eu podia desbravar todos os mares do mundo apenas escrevendo essas aventuras, que em minha mente, eram muito mais grandiosas do que as que apareciam nos livros de história da escola, sobre Colombo e Cabral.
            O passar dos anos e das leituras me fizeram aprender a dialogar com meus pais, saber construir bons argumentos e lutar pelos meus objetivos, o que afinal era esperado, já que eu havia travado e vencido batalhas muito mais difíceis com os monstros da minha imaginação. Com essa maior abertura familiar, eu não precisei mais me esconder e viver feliz apenas nesses pequenos mundos fictícios, o que também não significa que abandonei-os completamente. As visitas se tornaram mais escassas, mas a profundidade dos pensamentos aumentou, por conta das exigências da vida adulta. Hoje tenho a certeza que minha mente sempre será o meu lar, meu pequeno baú de tesouros, onde guardo desejos e busco inspirações para as obras escritas e desenhadas que ainda me aventuro a fazer.

Nenhum comentário:

Postar um comentário